Segundo a tradição messiânica, Jesus Cristo deveria nascer em Belém (Miq 5:2 e Mt 2:4-6), bem como nasceria de uma virgem. (Is 7:14 e Mt 1:18). Então, de acordo com os Evangelhos de Mateus e Lucas, Maria estava em adiantado estado de gravidez, mas precisou deslocar-se para Belém e, não encontrando hospedaria, terminou refugiando-se com José em uma estrebaria, onde teria nascido o menino Jesus.
Segundo a profecia, era assim mesmo que deveria acontecer, ou seja, o Messias deveria nascer naquelas circunstâncias para dar o principal testemunho de sua doutrina: o amor ao próximo. Assim, seu mandamento foi categórico em Jo 15:12:“Que vos ameis uns aos outros, assim como eu vos amei”. Mais incisivo ainda, quando um grande proprietário de terras lhe pediu conselhos sobre a vida eterna, não vacilou em determinar que doasse sua riqueza aos pobres:
“Falta-te uma coisa: vai, vende tudo quanto tens, e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, toma a cruz, e segue-me. Mas ele, pesaroso desta palavra, retirou-se triste; porque possuía muitas propriedades”. (Mc 10:21).
Pois bem, esses relatos datam de muitos séculos e há dúvidas histórias acerca da data precisa em que foram escritos e de sua autenticidade, mas é fato que foram adotados como a fonte única pela Igreja Católica e por todos os que se dizem Cristãos. Portanto, a fonte do que teria dito Jesus e de como teria se comportado na época, é uma só: os Evangelhos e as Cartas destinadas às primeiras comunidades cristãs. Documentos dos concílios e as encíclicas papais servem como orientação para os ritos e doutrina católica e, mesmo que escritos sob a inspiração divina e infalibilidade do Papa, não podem se sobrepor aos Evangelhos.
A relação de Jesus com os pobres e seu discurso contra as injustiças é uma constante nos Evangelhos. Esteve com leprosos, curou cegos e aleijados, defendeu uma prostituta e, mesmo quando foi convidado para jantar com um Fariseu, não perdeu a chance de cutucar os ricos:
“E dizia também ao que o tinha convidado: Quando deres um jantar, ou uma ceia, não chames os teus amigos, nem os teus irmãos, nem os teus parentes, nem vizinhos ricos, para que não suceda que também eles te tornem a convidar, e te seja isso recompensado. Mas, quando fizeres convite, chama os pobres, aleijados, mancos e cegos, E serás bem-aventurado; porque eles não têm com que te recompensar; mas recompensado te será na ressurreição dos justos”. (Lc 14:12-14).
Por fim, quando do juízo final, o julgamento será terrível para os que não acolheram toda a sorte de excluídos: famintos, sedentos, nus, doentes, presos, sem teto e estrangeiros:
“Então eles também lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede, ou estrangeiro, ou nu, ou enfermo, ou na prisão, e não te servimos? Então lhes responderá, dizendo: Em verdade vos digo que, quando a um destes pequeninos o não fizestes, não o fizestes a mim. E irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna”. (Mt 25:44-46)
Pois bem, séculos se passaram e, crendo ou não na dogmática católica ou cristã, a mensagem de igualdade, humildade, desapego e amor ao próximo é muito forte no discurso e prática de Cristo. Evidente que não se pode confundir a mensagem de Cristo e seu forte testemunho com as estruturas e dogmas das atuais Igrejas. O que faria Cristo, por exemplo, em dias atuais, no Vaticano dos Católicos ou no Templo de Salomão da Igreja Universal do Reino de Deus?
Neste Natal que se aproxima, finalmente, neste país de absurda desigualdade social, de séculos de exclusão e de todas as formas de descriminação, crendo ou não, para os que defendem uma nova forma de convivência humana, pautada na igualdade e respeito à dignidade humana, o discurso cristão nos convida à forte reflexão. Logo, sem atacar qualquer religião e respeitando a todas, cristãs ou não, o advento maior da tradição cristã não pode ser confundido com “ceias de natal”, “papai noel”, presentes ou lembrancinhas, mas como uma celebração que nos remete, à luz do que pregou Cristo, aos pobres, desvalidos e excluídos, pois este foi seu público preferido.
Neste sentido, são tantos os grupos excluídos nesse país que na hipótese de um nascimento de Cristo nesses tristes trópicos, em qual deles se sentiria mais “em casa”: sem-teto, sem-terra, índios, favelas, negros, prostitutas, homossexuais, delinquentes comuns, crianças abandonadas nas ruas, idosos abandonados em asilos, dependentes químicos…?
Pelo simbolismo da terra, a pacha mama, a detentora dos recursos naturais e lugar de produção do alimento para a humanidade, penso que Cristo nasceria de novo em um acampamento do MST. Não tenho dúvidas de que o menino seria muito bem vindo e acolhido entre os sem-terra. De outro lado, para reafirmar seu compromisso da primeira vinda, penso que Cristo, neste Natal, nascerá em todos os lugares em que ainda houver alguma injustiça e, portanto, distante, dos palácios, dos templos suntuosos, dos tribunais, das festanças, das mesas fartas, dos shoppings centers e de todos os lugares onde os hipócritas pronunciarão seu nome para celebrar o natal, pois como Ele mesmo disse:
“Raça de víboras, como podeis vós dizer boas coisas, sendo maus”? e “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Pois que sois semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora realmente parecem formosos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda a imundícia”. (Mt 12:34 e Mt 23:27). [1]
[1] Todas as citações são da versão da Bíblia on Line –https://www.bibliaonline.com.br/
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