Sob o contexto cultural estabelecido no Brasil, nas primeiras décadas do século XX, o estudo para a construção do campus Seropédica da UFRRJ foi aprovado preliminarmente, pelo governo federal, em 1937, em estilo neocolonial.
O início do século XX foi marcado pela difusão no país, do estilo arquitetônico neocolonial que era calcado na valorização e no resgate de elementos tradicionais da arquitetura brasileira, amadurecidos, principalmente, nos séculos XVII e XVIII. Uma “renascença brasileira” que nos livraria do ecletismo de origens europeias e valorizaria a herança cultural portuguesa, como diria o engenheiro e arquiteto português radicado em São Paulo, Ricardo Severo. (Lemos, 1989, p. 162).
Por outro lado, em fins dos anos 1920, ocorreu também a absorção das concepções inovadoras do movimento moderno que, grosso modo, propôs o oposto para a arquitetura. O movimento moderno destacou, dentre outros, a ruptura com elementos históricos e a priorização do uso e exposição de todo o potencial plástico das novas tecnologias construtivas emergentes, especialmente o concreto armado, o aço e o vidro. Todos esses elementos objetivaram dar coerência temporal às edificações voltadas a atender as novas funções urbanas, climáticas e ergométricas, demandadas pela modernidade. O quadro formado determinou ao estilo neocolonial um papel contraditório. Se por um lado, havia nascido de vanguarda, por se opor ao excesso de influências da arquitetura europeia, por outro, foi gradativamente se transformando em espécie de resistência conservadora, em face das transformações propostas pelo modernismo.
O campus surgiu como projeto de um Estado totalitário (Estado Novo), em atendimento às demandas tecnológicas oriundas de uma elite de produtores rurais, concentrando, num só lugar, os principais saberes e atividades de pesquisa relacionadas às ciências agrárias. Em 18 de outubro de 1938, o estudo foi aprovado definitivamente, pelo presidente Getúlio Vargas que autorizou o início das obras, bem como seu detalhamento e execução. (Rumbelapager, 2005, p. 94-97)
Cabe destacar que o governo federal considerou adequado na construção do campus, a adoção de elementos que caracterizassem um típico “ambiente rural” compatível com as atividades de ensino ligadas à tradição das atividades agropecuárias. A monumentalidade dos prédios deveria ser associada obrigatoriamente ao estilo neocolonial, criando uma relação entre a tradição das atividades agropecuárias e a tradição arquitetônica brasileira. Trata-se assim, de uma produção arquitetônica carregada de simbolismo que materializa em seu estilo, a temporalidade da maneira de um determinado seguimento social perceber e representar sua maneira de pensar e produzir arquitetura. (Bourdieu, 2007)
O arquiteto Ângelo Murgel, como coordenador geral, liderou grande equipe de colaboradores que, no período 1938-1948, desenvolveu o projeto do campus e acompanhou a construção do conjunto de edificações em área originalmente pertencente à Fazenda Imperial de Santa Cruz, de propriedade dos jesuítas até 1759 (ano da sua expulsão do Brasil).
As edificações que compõem o campus apesar de estruturadas em concreto armado, com vedações em tijolos cerâmicos, exibem em suas fachadas elementos arquitetônicos e ornatos extraídos da arquitetura religiosa, civil rural e urbana características do período colonial brasileiro. Observam-se nas fachadas dos pavilhões, especialmente do Pavilhão Central (P1), frontão caprichoso inspirado na arquitetura religiosa barroca, vãos de janelas em arco abatido com sobreverga em massa, beirais encachorrados, circulações internas em varandas, definidas por colunas toscanas etc.
O partido arquitetônico adotado nos principais pavilhões do campus, inclusive o P1, se baseou na adoção de pátios internos centralizados, definidos por arcaria plena, assente em pares de robustos pilares e providos de jardins com espelho d`água, lembrando os claustros dos antigos conventos jesuítas. Cabe também destacar, na elaboração dos projetos, a participação de Eric Hess que foi o responsável por pesquisas fotográficas sobre arte colonial religiosa e civil no Brasil, que se transformaram em fontes inspiradoras das soluções arquitetônicas adotadas nos projetos do campus. (Rumbelapager, 2005, p. 99 a 108)
A partir da análise do acervo foi possível identificar a participação efetiva de Sigaud no projeto do Pavilhão Central (P1), a principal edificação do conjunto arquitetônico do campus, por intermédio de vários estudos e projetos arquitetônicos, por ele assinados, que apresentam várias técnicas de desenho e suportes. Os elementos compositivos do P1 mimetizam diversos elementos arquitetônicos e ornamentais da arquitetura civil da aristocracia rural, amadurecida no século XVIII, bem como alguns elementos da arquitetura religiosa barroca e jesuítica, cuja percepção é favorecida em função da sua escala e implantação, em posição de destaque no sítio que abriga o conjunto.
Por: Cláudio Antônio S. Lima Carlos
Professor associado do Departamento de Arquitetura e Urbanismo do Instituto de Tecnologia e Professor do Programa de Pos graduação e Patrimônio, cultura e sociedade, PPGPACS. Do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ
Notícias de Seropédica, do Brasil e do Mundo