Pesca predatória, crises de saúde pública e crimes ambientais ameaçam a estabilidade global
Quando os ecossistemas são explorados além do seu limite e deixam de fornecer recursos essenciais como alimento, água potável, ar puro e abrigo, as consequências vão muito além de um problema ambiental. Estudos indicam que essas crises ambientais também representam uma ameaça direta à segurança nacional.
Embora essa conexão nem sempre receba a devida atenção, impactos ambientais podem levar à instabilidade social e política, desencadear crises econômicas e gerar tensões entre países.
Essas ameaças surgem quando ecossistemas vitais são degradados a ponto de não conseguirem mais suprir as necessidades humanas. Entre os principais fatores de risco estão a pesca predatória, os surtos de doenças e os crimes ambientais.
PEIXES EM DISPUTA
A pesca é uma das principais fontes de proteína para 3,2 bilhões de pessoas. Quando os estoques de peixes são explorados além da capacidade de regeneração, disputas pelo acesso a esses recursos podem escalar para conflitos internacionais.
Entre as décadas de 1950 e 1970, pescadores britânicos e islandeses entraram em confronto pelo bacalhau no Atlântico Norte. Com os estoques da espécie em declínio, o governo da Islândia tentou ampliar sua zona de exclusão para impedir a pesca estrangeira.
Os britânicos, no entanto, resistiram à restrição, resultando em confrontos entre pesqueiros e barcos de patrulha islandeses, além da intervenção da Marinha Real Britânica.
As chamadas “Guerras do Bacalhau” levaram ao rompimento temporário das relações diplomáticas entre os dois países. No fim, o Reino Unido aceitou respeitar um limite de 200 milhas náuticas para a pesca na região.
Situação semelhante ocorre hoje com a China, que, após esgotar seus estoques, passou a explorar intensivamente as águas do Mar do Sul da China, utilizando sua frota pesqueira para reforçar reivindicações territoriais. Como resposta, a Indonésia destruiu mais de 40 barcos chineses, acusando-os de pesca ilegal e estimando um prejuízo de mais de US$ 4 bilhões anuais.
As frotas chinesas também têm expandido suas atividades para as costas da África e da América do Sul, onde a pesca excessiva já provoca impactos ambientais e instabilidade política. Em 2024, os EUA e a Argentina iniciaram patrulhas conjuntas para combater a pesca ilegal na região.
CRISES AMBIENTAIS E DE SAÚDE PÚBLICA
Muitas das crises sanitárias mais graves das últimas décadas foram causadas por doenças zoonóticas, ou seja, enfermidades transmitidas de animais para humanos devido ao contato próximo com a fauna silvestre.
Atualmente, mais de 70% das doenças infecciosas emergentes têm origem nesse tipo de transmissão. O risco é especialmente alto entre populações que manuseiam ou consomem carne de caça.
pesca predatória, surtos de doenças e crimes ambientais são os principais fatores de risco.
Um exemplo recente foi o surgimento do coronavírus SARS-CoV-2, responsável pela pandemia de Covid-19. Estudos indicam que o vírus foi transmitido pela primeira vez a humanos por meio de animais no mercado de Wuhan, na China.
Durante a pandemia, países com altas taxas de mortalidade enfrentaram crescentes protestos, aumento da violência política e desconfiança nas autoridades, à medida que a população perdia a fé na capacidade dos governos de protegê-la.
Além da Covid-19, outras doenças zoonóticas, como zika, ebola, SARS e o vírus do Nilo Ocidental, também causaram crises econômicas e políticas em diferentes partes do mundo.
O IMPACTO DOS CRIMES AMBIENTAIS
O tráfico ilegal de animais silvestres e produtos florestais movimenta entre US$ 91 bilhões e US$ 258 bilhões por ano, sendo um dos mercados criminosos mais lucrativos do mundo – comparável ao tráfico de drogas (US$ 344 bilhões) e ao tráfico humano (US$ 157 bilhões).
A demanda por espécies raras e partes do corpo de animais selvagens financia grupos terroristas, cartéis de drogas e redes de crime organizado.

Além disso, o desmatamento ilegal tem sido uma importante fonte de financiamento para grupos extremistas, como o Al-Shabaab, na Somália, que utiliza o comércio de carvão para sustentar suas operações. Essas atividades criminosas têm desestabilizado diversos países na região conhecida como Chifre da África.
A segurança de um país não depende apenas de sua força militar. A preservação dos ecossistemas, a manutenção da biodiversidade e o acesso sustentável aos recursos naturais são essenciais para evitar crises que possam levar a conflitos.
Os governos já investem na proteção de infraestruturas fundamentais, como estradas, redes de comunicação e sistemas de energia. Mas o meio ambiente também desempenha um papel essencial na estabilidade social e política – e precisa ser tratado como um elemento central nas políticas de segurança nacional.
Este artigo foi publicado originalmente no “The Conversation” e reproduzido sob licença Creative Commons. Leia o artigo original
Por: Fast Company Brasil
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