Por meio de atividades formativas, o projeto Saúde das Mulheres Negras capacita lideranças comunitárias da Baixada Fluminense (RJ) e capital para atuarem em incidência política
Mulheres negras de dez municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro ganham uma nova ferramenta de combate ao racismo no sistema público de saúde. Lançado ontem(25), pela ONG CRIOLA, o projeto Saúde das Mulheres Negras vai qualificar cerca de 50 lideranças comunitárias, religiosas, movimentos sociais e coletivos de Belford Roxo, Duque de Caxias, Japeri, Magé, Mesquita, Nova Iguaçu, Queimados, Rio de Janeiro, São João de Meriti, Seropédica, além de Regiões Quilombolas, representadas pela Associação das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro (ACQUILERJ), para articularem e fortalecerem sua atuação na incidência política e na luta por melhorias no setor. A jornada formativa acontece até a próxima sexta-feira (29).
A escolha do território considerou os dados da Pesquisa Nacional de Saúde, que demonstram uma não-equidade na Atenção Primária, considerada porta de entrada para a saúde pública, da Região Metropolitana do Rio. A área possui uma das menores taxas de cobertura de APS do país, com apenas 47,5%, comparado à média nacional de 77,2%.
Lúcia Xavier, coordenadora geral de CRIOLA, destaca a importância da integralidade da saúde como dispositivo de fortalecimento, cuidado e longevidade. “A saúde é parte fundamental do processo político de manutenção da vida e é nela que irão aparecer todos os problemas que essa população enfrenta: o adoecimento mental, a violência da sociedade e do Estado, o impedimento da capacidade de prover novas gerações, de se constituir como sujeito íntegro, que possa trabalhar, estudar, amar e viver. Ter vida é ter saúde e isso passa pelo acesso a condições adequadas de existência. Quando essas condições são impedidas ou interrompidas, perde-se a autonomia para exercê-la plenamente. Para a tradição afro-brasileira, o corpo é a morada dos Deuses e, nessa perspectiva, a saúde deve ser vista de maneira integral, relacionando bem-estar físico e social, interação na comunidade e relacionamento com a natureza”, afirma Lúcia Xavier.
Durante o evento de abertura, as integrantes da jornada formativa desenvolveram a atividade ‘Mapa Falante’ onde, divididas por regiões, levantaram um diagnóstico da saúde de seus territórios a partir de suas experiências e perspectivas. A fundadora e coordenadora do Núcleo de Mães Vítima de Violência, Deize Silva de Carvalho, apontou a ineficiência do Sistema de Regulação de Atendimento no SUS (SISREG) como uma das questões mais sensíveis no atendimento às mulheres negras e periféricas do município do Rio de Janeiro. “A saúde mental de mulheres tem sido afetada pela letalidade do Estado e pela ausência da saúde pública. Uma doença como o câncer não espera chegar a sua vez na fila do SUS. A Constituição diz que temos garantias e direitos, como o acesso à saúde, mas o Estado é o maior violador dos Direitos Humanos. Enquanto lideranças em movimentos sociais, somos a voz que denuncia essas violações. Porque aqueles que têm o poder nas mãos não frequentam hospital público, não conhecem a saúde precária que vivemos, não sofrem os impactos de uma violência verbal de um profissional da saúde que, muitas vezes, faz com que essa mulher nem mesmo procure o hospital”, aponta Deize.
Articulação vai desenvolver ações para efetivação do programa
De acordo com a líder de projetos em CRIOLA, Winnie Samanú, após a jornada formativa, a missão do grupo será a implementação dos planos de incidência política, construídos e discutidos ao longo da semana. A efetivação se dará, considerando as especificidades dos territórios envolvidos no programa, a partir de mobilizações locais com parceiros, na atuação das UBS (Unidades Básicas de Saúde) e pela formação de redes de apoio mútuo. “A força política das mulheres negras da região engajada impressiona! Essas lideranças atuam cotidianamente na luta pela garantia de direitos de suas comunidades, em diversas dimensões e áreas. Esse projeto de CRIOLA, em aliança a essas potências da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, vem da urgência de olharmos integralmente a saúde das mulheres negras, a partir das forças políticas e do desenvolvimento de planos de incidência”, lembra Winnie.
Confira a lista dos grupos integrantes do projeto Saúde das Mulheres Negras
-As Josefinas, Instituto Mover Vidas
-Associação Centro Social Fusão
-Instituto Maria Luz
-Asplande
-Grupo de Mulheres Yepondá
-Casa do Perdão
-Associação de Mulheres de Atitude e Compromisso
-Associação Missão Resplandecer
-Núcleo de Mães Vítimas de Violência
-Comissão Pastoral da Terra
-Associação de Mulheres de Duque de Caxias
-Elas Existem, Coletivo mulheres cuidando movimento territórios
-Rede de Comunidades e Movimento contra Violência
-Frente Estadual pelo Desencarceramento
-Quilombo Quilombá
-Teia da Zona Oeste
-Instituto Casa das Pretas
-Coletivo Terreiro Oba Labi (Grupo de Feminilidades As Padilhas)
-Coletivo Filhos nos Braços do Pai
-Igreja Evangélica Projeto Além do Nosso Olhar IPANO
-Ilê Omiojuarô
-TtransdiverSUS
-Mulheres de Pedra
-Casa da Cultura Centro de Formação Artística e Cultural da Baixada Fluminense
-Movimento Negro Unificado
-Quilombo Dona Bilina
-Capelania Ceifa Jeová
-Axé Kwê Cejá
-Fórum Permanente de Mulheres Negras Cristãs
-Rede de Mães e Familiares Vítima do Terrorismo do Estado
-Coletivo de Mulheres do Morro do Sossego
-Coletivo Todxs Unidxs
-Instituto Cultural Águas do Amanhã
-Projeto Social Mais Saúde
-Sim, eu sou do Meio
-Ilê Áse Ogun Alakorô
-Quilombo do Feital
-Ilê Asé Iyá Manjele’o
-Fórum Grita Baixada
-Morhan
Sobre Criola
CRIOLA é uma organização da sociedade civil fundada em 1992 e conduzida por mulheres negras. Atua na defesa e promoção de direitos das mulheres negras em uma perspectiva integrada e transversal, tendo por missão trabalhar para a erradicação do racismo patriarcal cisheteronormativo, contribuindo com a instrumentalização de meninas e mulheres negras, cis e trans, para a garantia dos direitos, da democracia, da justiça e pelo Bem Viver.
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