Veja o vídeo abaixo e entenda o que é e como funcionará a Intervenção Federal no Rio de Janeiro.
https://youtu.be/rAGuUikK-Us
O governo de Michel Temer assinou nesta sexta-feira um decreto que determina a
intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro, deixando a segurança pública
fluminense sob responsabilidade de um interventor militar, que responde ao
presidente da República. Assim, a segurança pública do Rio sai da esfera estadual
e vai para a federal, com comando militar, até 31 de dezembro de 2018.
Assim como diversos Estados do país, o Rio de Janeiro vive uma crise de
segurança. Episódios de violência durante o Carnaval teriam influenciado a tomada
de decisão pelo governo.
A intervenção federal nos Estados está prevista na Constituição de 1988, mas
nunca tinha sido aplicada até agora. Segundo o governo Temer, o objetivo da
medida é “conter grave comprometimento da ordem pública”, mas ainda não está
definido concretamente como será essa intervenção.
“Não há agora, nessas poucas horas, como antecipar como será isso. O que o
cidadão poderá sentir e ter é um sistema muito mais robusto de segurança social,
com coordenação mais estreita, capacidade operacional maior, inteligência bem
mais integrada”, declarou o ministro da Defesa, Raul Jungmann.
Abaixo, saiba mais sobre a intervenção federal no Rio de Janeiro, inédita no Brasil.
1- O que é a intervenção federal no Rio de Janeiro?
O governo federal fará uma intervenção na área de segurança pública no Estado do
Rio de Janeiro até 31 de dezembro deste ano. Com isso, a responsabilidade de
gerir essa área, que é estadual, passa para as mãos do governo federal, que será
representado por um interventor.
Foi nomeado para o cargo o General do Exército Walter Braga Netto, que lidera o
Comando Militar do Leste (Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo). Com
isso, o secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, Roberto Sá, entregou o
cargo.
A partir de agora, o interventor passa a ter total poder para gerir a segurança
pública fluminense, controlando a Polícia Civil, a Polícia Militar, os bombeiros e
administração penitenciária. Mas, por enquanto, não há definição de estratégias.
“Eu recebi a missão agora. Nós vamos entrar numa fase de planejamento. No
momento, não tenho nada que eu posso adiantar para os senhores. Vamos fazer
um estudo, vamos conversar com todos. E nossa intenção é fortalecer ainda mais o
sistema de segurança do Rio de Janeiro, para voltar a atuar conforme merece a
população carioca”, afirmou Braga Netto.
O interventor não terá qualquer controle sobre outras áreas da administração
fluminense. Nem sobre outros poderes – as atividades do Ministério Público
Estadual, por exemplo.
Na prática, o que pode ocorrer é uma reorganização das forças de segurança. “Não
tem gente nova, os recursos são os mesmos. As polícias já estão nas ruas do Rio.
O Exército também. O que poderá ser feito é que as forças de segurança sejam
alocadas de forma diferente e reestruturadas. Não haverá uma mudança de um dia
para o outro”, explica Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro
de Segurança Pública.
2- Qual a diferença entre a intervenção federal e as outras
ocasiões em que Exército e Força Nacional atuaram no Rio?
Até hoje, o Rio de Janeiro e outros Estados tinham sido auxiliados pela União na
gestão da segurança pública por meio das operações de Garantia da Lei e da
Ordem (GLO) e do emprego da Força Nacional.
As operações de GLO permitem a atuação das Forças Armadas na segurança
pública, de forma excepcional, em momentos de grave perturbação da ordem e
esgotamento das forças tradicionais de segurança. Da mesma forma, a Força
Nacional é uma força de segurança federal, usada para auxiliar as operações de
segurança dos Estados, após solicitação dos mesmos.
Tanto durante as operações da GLO como durante o emprego da Força Nacional,
os governos estaduais continuam responsáveis pela gestão da segurança pública.
As atividades das forças da União são coordenadas com os Estados.
Já na intervenção federal no Rio de Janeiro, toda a segurança pública fluminense
sai da esfera estadual e fica sob o comando do interventor militar. Ou seja, não se
trata apenas do emprego das Forças Armadas ou de forças federais. Mas sim da
gestão federal de uma área que antes era coordenada pelo poder estadual.
“O emprego da GLO e da Força Nacional ocorrem de forma emergencial, pontual –
um conjunto de policiais ou militares é enviado para ajudar a solucionar uma crise
aguda. Já a intervenção assume a gestão e administração de toda a segurança
pública”, explica Sérgio de Lima.
“Na intervenção federal, o interventor pode adotar atos que o governador ou o
secretário tomariam. Isso é algo impensável na GLO. Na GLO, os atos do governo
estadual não ficam suspensos”, fala Eloísa Machado, professora da FGV e
especialista em política constitucional. “A intervenção federal é uma medida muito
mais drástica que a GLO, sinal de uma anormalidade institucional grave”.
3- O que diz a Constituição sobre a intervenção federal?
A Constituição de 1988 prevê a intervenção federal nos Estados, mas o instrumento
nunca antes tinha sido acionado. Ele prevê a nomeação de um interventor federal
para solucionar um grave problema estadual, removendo as autoridades locais.
Entre os cenários passíveis de intervenção está a necessidade de “pôr termo a
grave comprometimento da ordem pública” – que está sendo aplicado no Rio de
Janeiro. Outras opções possíveis para a intervenção são reorganizar as finanças do
Estado ou repelir invasão estrangeira.
A intervenção federal precisa ser feita por decreto, estipulando prazo e condições, e
deve ser submetida à aprovação do Congresso Nacional.
A Constituição não é clara sobre como seria uma intervenção federal. Não
menciona, por exemplo, a possibilidade de haver uma intervenção em uma área
específica da administração estadual, como a segurança pública. Por isso, Sérgio
de Lima acredita que há espaço para contestação legal: “O risco de judicialização é
gigantesco”.
4- Qual a diferença entre intervenção federal e Estado de Defesa e Estado de Sítio?
O ministro da Defesa afirmou que a intervenção federal só está abaixo do Estado de
Sítio e do Estado de Defesa. Mas, ao contrário das duas últimas, a intervenção não
implica em “qualquer transferência de responsabilidade entre as instituições. Tudo
permanece como antes”.
Em uma intervenção legal, não estão suspensos os direitos fundamentais do
cidadão, como o direito de ir e vir, de protestar, de se reunir, a exigência de
mandato judicial para busca e apreensão em domicílio, a prisão apenas sob
circunstâncias legais e o direito ao devido processo legal.
A única diferença em relação ao estado normal é que o governo federal assume,
provisoriamente, um poder estadual. “A intervenção federal é a flexibilização
excepcional e temporária da autonomia dos Estados. Não há nenhum tipo de
restrição de direitos”, explica Eloísa Machado.
Já o Estado de Defesa e o Estado de Sítio são momentos de exceção
constitucional, levando à suspensão de direitos fundamentais. O Estado de Defesa
pode ser acionado, por exemplo, para responder a calamidades naturais. E o de
Sítio, em casos de guerra.
“A intervenção federal não suspende os direitos das pessoas. É uma questão
puramente de administração pública. A população não poderá ser vitima de nenhum
ato de violação de direitos sob justificava da intervenção”, complementa Sérgio de
Lima.
5- Qual o impacto dessa medida fora do Rio de Janeiro?
O impacto da medida extrapola o Rio de Janeiro, uma vez que a Constituição prevê
que, durante uma intervenção federal, não pode haver qualquer alteração
constitucional no país. Isso inviabilizaria, por exemplo, a Reforma da Previdência.
Porém, o governo Temer informou nesta sexta-feira que pretende anular a
intervenção federal no Rio de Janeiro momentaneamente, com objetivo de votar a
Reforma da Previdência.Nesse caso, a figura do interventor deixaria de existir, deixando um vácuo no
comando da segurança pública fluminense. Segundo o governo Temer, seria então
acionada, provisoriamente, a Garantia da Lei e da Ordem, até o término da votação
da reforma.
Além disso, o fato de o governo federal assumir a segurança pública de um Estado
pela primeira vez pode fazer outras regiões do país cobrarem medidas
semelhantes.
6- Por que essa medida está sendo tomada no Rio de Janeiro, e não em outros Estados?
O Rio de Janeiro vive uma grave crise de segurança pública, com aumento do
número de homicídios, de mortes de policiais e confrontos com criminosos. Porém,
outros Estados vivem emergências de segurança tão ou mais agudas.
Enquanto a taxa de homicídios no Rio de Janeiro foi de 32 por 100 mil habitantes
em 2017, no Acre foi de 55 por 100 mil e, no Rio Grande do Norte, de 69 por 100
mil.
Só no início deste ano, o Ceará teve a maior chacina da sua história, seguida de um
massacre no sistema prisional. No Rio Grande do Norte, forças de segurança
entraram em greve, ampliando o cenário de violência. Goiás viveu uma série de
rebeliões no sistema prisional. (http://www.bbc.com/portuguese/brasil-42577959)
Além disso, no ano passado, massacres no sistema prisional do Amazonas e de
Roraima lançaram luz sobre a expansão da disputa das facções criminosas pelo
país. No Espírito Santo, a Polícia Militar paralisou suas atividades, gerando uma
onda inédita de violência no Estado (http://www.bbc.com/portuguese/brasil-
38884516). O pacato Acre se tornou o Estado onde a violência mais cresce no país,
com decapitações e execuções bárbaras. (http://www.bbc.com/portuguese/brasil-
42783116)
“Essa intervenção no Rio de Janeiro é fruto da conveniência política do governo
Temer. Vários Estados poderiam se enquadrar (em uma intervenção federal na
segurança pública). Não tem como dizer que o Rio de Janeiro é um caso mais
grave do que outros Estados, como Goiás, Rio Grande do Norte, Ceará, Espírito
Santo”, fala Sérgio de Lima.
O governador fluminente Luiz Fernando Pezão é do mesmo partido de Temer, o
MDB.
7- É uma intervenção militar?
“Não é intervenção militar. Nunca passou isso pela nossa cabeça. É uma
intervenção federal, na qual o interventor é um general”, afirmou o ministro da
Defesa Jungmann.
Porém, além de escolher um general como interventor, o decreto do governo federal
estipula que o cargo é de natureza militar. “A previsão constitucional de intervenção
federal não é um instrumento de intervenção militar. Não é para troca de governo
civil por governo militar. Mas o governo está substituindo uma autoridade civil por
uma militar. É um retrocesso democrático”, opina Eloísa Machado. Segundo ela, a
natureza militar do cargo faz com que o interventor fique sob jurisdição militar, não
civil.
Em coletiva de imprensa, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional General
Sérgio Etchgoyen foi questionado se a intervenção militar não poderia colocar a
democracia em risco. “As Forças Armadas jamais foram ameaça à democracia em qualquer tempo, após a redemocratização. Ameaça à democracia é a incapacidade
de as polícias estaduais em enfrentarem a criminalidade”, respondeu.
Por outro lado, intervenção federal de natureza militar acaba jogando no colo das
Forças Armadas uma atribuição que não é sua – a segurança pública. Isso poderia
prejudicar a execução de outras atividades de responsabilidade militar. “A
intervenção tira a capacidade de resposta do Exército a atividades que são
exclusivas a ele, como fiscalização de armas e explosivos”, afirma Sérgio de Lima.
Inclusive, o comandante das Forças Armadas, general Eduardo Villas Bôas, já
declarou publicamente sua preocupação com a frequência do uso das forças
militares na segurança pública.
“Preocupa-me o constante emprego do Exército em intervenções (GLO) nos
Estados. Só no Rio Grande do Norte, as Forças Armadas já foram usadas três
vezes em 18 meses. A segurança pública precisa ser tratada pelos Estados com
prioridade zero. Os números da violência corroboram as minhas palavras”, afirmou
em post no Twitter em 30 de dezembro.
Vídeo: Canal Hoje no Mundo Militar – https://www.youtube.com/watch?v=D8oa2jP2TFQ
Formado em Sistemas de Informação pela FAETERJ, carioca de coração, apaixonado por teologia, tecnologia, matemática, geografia, história e pela sociedade em geral.