Extraído do Livro: «O Inferno Existe – Provas e Exemplos, Servo de Deus Pe. André Beltrami, SDB»
Não há verdade tão inculcada na Sagrada Escritura como a da existência do inferno. Escritores inspirados falam dele continuamente, para que os homens, horrorizados com as penas que aí se sofrem abandonem o vício e se deem à prática da virtude.
Os protestantes, que de nossa santa religião negaram quase todas as verdades mais difíceis de crer e praticar não souberam desfazer-se do dogma do inferno, pelo fato de ser frequentemente recordado nas Sagradas Letras. Por este motivo, uma senhora católica, importunada por dois ministros protestantes a passar para a reforma, saiu-se com esta sensata resposta: – “Senhores, fizestes na verdade uma bela reforma, suprimistes o jejum, a confissão, o purgatório; infelizmente, porém, conservastes os inferno. Tirai também este e eu serei dos vossos.”
Para não multiplicarmos as citações, deixaremos o Antigo Testamento e viremos logo ao Evangelho, para ouvir a palavra de Jesus Cristo, que por bem quinze vezes proclama este lugar de tormentas. E para causar em nós um temor salutar e dar-nos uma ideia justa do inferno, Ele o chama fogo inextinguível, trevas exteriores, onde haverá pranto e ranger de dentes, lugar de tormentos, fornalha de fogo, Geena de fogo.
A geena era um vale perto de Jerusalém, onde alguns maldosos hebreus apóstatas de sua religião, sacrificavam a Moloc os tenros filhos, expondo-os antes ao fogo. O piedoso rei Josias, para abolir esse bárbaro costume, fez aterrar o vale, ordenando que se lançasse aí a imundície da cidade e os cadáveres aos quais fosse negada a sepultura; e como medida profilática, conservava-se sempre aceso o fogo. O nosso Divino Salvador, para tornar mais sensível a ideia do inferno, tomou a imagem desse vale, que os hebreus abominavam, dando-lhe precisamente o nome de geena.
Na parábola do rico epulão, tão fecunda de ensinamentos e que é tão importuna aos ricos gozadores do mundo, Jesus nos ensinou que o mau uso das riquezas conduz inevitavelmente ao inferno, enquanto as dificuldades e as privações suportadas por amor de Deus levam ao lugar de eterna felicidade.
“Havia um homem rico, que se vestia de púrpura, e de linho e que todos os dias se banqueteava esplendidamente. Havia também um mendigo, chamado Lázaro, o qual coberto de chagas, estava deitado à sua porta, desejando saciar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico, e ninguém lhas dava; mas os cães vinham lamber-lhe as chagas. Ora, sucedeu morrer o mendigo, e foi levado pelos anjos ao seio de Abraão. Morreu também o rico, e foi sepultado no inferno. E, quando estava nos tormentos, levantando os olhos, viu ao longe Abraão, e Lázaro no seu seio; e, gritando disse: Pai Abraão, compadece-te de mim, e manda a Lázaro que molhe em água a ponta do dedo, para refrescar a minha língua, pois sou atormentado nesta chama. E Abraão disse-lhe: Filho, lembra-te que recebeste os bens em tua vida e Lázaro, ao contrário, males por isso ele é agora consolado e tu és atormentado. E, além disso, há entre nós e vós um grande abismo; de maneira que os que querem passar daqui para vós não podem, nem os de aí passar para cá. E disse: Rogo-te pois, ó pai, que mandes à casa de meu pai. Pois tenho cinco irmãos para que os advirta disto e não suceda virem também eles para este lugar de tormentos. E Abraão disse-lhe: Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos. Ele, porém disse-lhe: Não, Pai Abraão, mas se algum dos mortos for ter com eles, farão penitência. E ele disse-lhe: Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tão pouco acreditarão ainda que ressuscitaste algum dos mortos”. (S. Lucas, XVI, 19-31).
Eis aí descrito com vivas cores aquele reino de dor, onde um fogo abrasador e horrível atormentará sem um instante de trégua o mísero condenado: uma gota, só uma gota de água pedia o epulão para mitigar os ardores insuportáveis da sede, e essa gota foi-lhe negada sem dó! Ai! quem de vós, branda aos ímpios o Profeta Isaías, cheio de espanto, quem de vós poderá habitar nesse fogo devorador? nesses ardores sempiternos?
Ao final da parábola, acena-se à repugnante incredulidade de tantos infelizes que vivem engolfados nos vícios, não fazendo caso das verdades eternas, nas quais não creriam nem mesmo se aparecesse algum réprobo para lhes atestar a existência do inferno. Qual não será o seu desespero ao verem-se um dia sepultados naquele abismo de tormentos, sem a mínima esperança de saírem de lá?
Alhures, Jesus Cristo descreve o juízo universal que ele fará no fim do mundo, e a sentença de eterna condenação que pronunciará contra aqueles que não praticarem as obras de misericórdia para com os seus irmãos, e que serão precipitados no fogo inextinguível, preparado para o demônio e seus sequazes. Quanto temor não causa à alma a consideração deste trecho do Evangelho! Ah! se os libertinos, que negam com tanto atrevimento a vida futura, refletissem um pouco, certamente mudariam de vida! Fruto desta meditação foi aquela poesia tão sublime do Dies irae, que é o gemido de uma alma toda compenetrada do terror do juízo divino e da sorte eterna que a espera depois.
“Quando vier o Filho do homem na sua majestade, e todos os anjos com Ele, então se sentará sobre o trono da sua majestade, e serão todas as gentes congregadas diante dele, e separará uns dos outros como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. E porá as ovelhas à sua direita, e os cabritos à esquerda. Então o Rei dirá aos que estiverem à sua direita: Vinde benditos de meu Pai, possuí o reino que vos está preparado desde o princípio do mundo; porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era peregrino e recolhestes-me; nu, e me vestistes; enfermo, e me visitastes; estava no cárcere e fostes visitar-me. Então lhe responderão os justos, dizendo: Senhor, quando é que nós te vimos faminto e te demos de comer; sequioso e te demos de beber? E quando te vimos peregrino, e te recolhemos; nu, e te vestimos? Ou quando te vimos enfermo, ou no cárcere e fomos visitar-te? E, respondendo o Rei, lhes dirá: Na verdade vos digo que todas as vezes que vós fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes. Então dirá também aos que estiverem à esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno que foi preparado para o demônio e para os seus anjos; porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber; era peregrino, e não me recolhestes; nu, e não me vestistes; enfermo e no cárcere e não me visitastes. Então eles também lhe responderão, dizendo: Senhor, quando é que nós te vimos faminto, ou sequioso, ou peregrino, ou nu, ou enfermo, ou no cárcere, e não te assistimos? Então lhes responderá, dizendo: Na verdade vos digo: todas as vezes que o não fizestes a um destes mais pequeninos, a mim não o fizestes. E estes irão para o suplício; e os justos para a vida eterna.” (S. Mateus, XXV, 31-46).
E para tornar entre o povo mais familiar, diria quase visível o pensamento do inferno, usa a comparação dos rebentos e da videira.
“Eu sou a videira e vós os rebentos. O que permanece em mim e eu nele, esse dá muito fruto, porque, sem mim, nada podeis fazer. Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora como o rebento, e secará, e enfeixá-lo-ão, e o lançarão no fogo, e arderá.” (S. João, XV, 5-6).
Falando depois, dos escândalos, o nosso bendito Salvador, de ordinário cheio de doçura e mansidão toma um tom terrível e os ameaça de condenação eterna.
“Ai do mundo por causa dos escândalos! Porque é necessário que sucedem escândalos; mas ai daquele homem pelo qual vem o escândalo! E, se a tua mão te escandalizar, corta-a; melhor te é entrar na vida manco, do que, tendo duas mãos, ir para o Inferno, para o fogo inextinguível, onde o seu verme não morre, e o fogo não se apaga. E se o teu pé te escandaliza, corta-o; melhor te é entrar na vida eterna coxo, do que, tendo dois pés, ser lançado no inferno, num fogo inextinguível, onde seu verme não morre, e o fogo não se apaga. E se o teu olho te escandaliza, lança-o fora; melhor te é entrar no reino de Deus sem um olho, do que tendo dois, ser lançado no fogo do inferno, onde o seu verme não morre, e o fogo não se apaga. Porque todo o homem será salgado pelo fogo, e toda vítima será salgada com sal”. (S. Marcos, IX, 42-48).
Santo Tomaz explica que esse verme que não morre é o remorso da consciência, que para sempre há de atormentar o condenado no inferno; remorso pelo grande bem que perdeu, ele que tinha tantos meios de se salvar.
A expressão será salgado pelo fogo significa que, assim, como o sal conserva as coisas, assim o fogo, no qual os condenados serão imersos, ao mesmo tempo que crucia atrozmente os conserva sempre em vida. Aí o fogo consome, diz S. Bernardo, para conservar sempre. Neste trecho faz-se alusão manifesta aos sacrifícios legais que os hebreus tinham sempre diante dos olhos, e onde estava prescrito que se aspergisse com sal a vítima que era oferecida a Deus: na verdade, os condenados são como vítimas da divina justiça.
Eis como Jesus Cristo, prevendo os assaltos que os incrédulos e libertinos dariam ao dogma do inferno, o proclama continuamente no Evangelho. Quanto a nós, permaneçamos inabaláveis em nossa crença, certos da existência do inferno, como da existência do sol, da lua e das outras coisas que nos rodeiam. Deus nô-lo revelou e ensina por meio da Igreja, e a palavra de Deus não falha.
IMPRIMATUR: Por comissão especial do Exmo. e Revmo. Sr. Bispo de Niterói D. José Pereira Alves. Niterói, 1.º de janeiro de 1945. Pe. Francisco X. Lanna, SS.
Formado em Sistemas de Informação pela FAETERJ, carioca de coração, apaixonado por teologia, tecnologia, matemática, geografia, história e pela sociedade em geral.