Transferida para a União há seis meses, rodovia que liga Caxias a Itaguaí continua às escuras e, agora, está sem patrulhamento
À luz do dia, má conservação, acessos improvisados e construções irregulares. À noite, escuridão e violência. A qualquer hora, a segurança dos motoristas está por um fio no Arco Metropolitano , rodovia inaugurada em 2014 que custou cerca de R$ 2 bilhões . Na última semana, O GLOBO percorreu duas vezes a estrada e encontrou um cenário desolador. Seis meses após o estado devolver a administração da via para a União, a situação só se agravou. A Polícia Rodoviária Federal (PRF), atual responsável pelo patrulhamento, admite que nenhum agente fica baseado nos 72 quilômetros de pistas entre Caxias e o Porto de Itaguaí.
Só no primeiro trimestre deste ano, 107 veículos foram roubados no Arco. O número representa 35% do total registrado em 2017 (303) e 23,8% das ocorrências no ano passado (448). Os dados da PRF também indicam que o transporte de cargas ainda é um dos principais alvos dos bandidos. Só este ano, 11 casos foram registrados na via, cinco no mês de março.
Em outubro do ano passado, o estado devolveu a gestão da rodovia para o governo federal. Desde então, o Ministério dos Transportes estuda a concessão do trecho. Na época, a Secretaria estadual de Obras informou que a decisão foi consequência do agravamento da crise econômica, que “provocou um crescente desequilíbrio nas finanças do estado, impossibilitando o governo de arcar com os custos da rodovia”. As despesas com a manutenção, segundo a pasta, ficam em torno de R$ 19 milhões por ano.
Deserta e escura
Abandonada pelas autoridades, a via que foi projetada para receber 30 mil veículos por dia tem sido cada vez mais evitada. A falta de policiamento ostensivo e o “blackout” provocado pelo furto das baterias que armazenam a energia solar da iluminação pública são os principais motivos. Por toda a extensão, há vários postes caídos nos canteiros, resquício da ação dos ladrões que começou logo após a inauguração da estrada. Cada um dos mais de quatro mil pontos de iluminação custou, na época, R$ 22 mil. O Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) não informou quantos carros passam pelo local atualmente, mas, no segundo semestre de 2018, o último balanço divulgado pelo Departamento de Estradas de Rodagem do estado (DER-RJ) indicava que menos de 15 mil veículos trafegavam por lá diariamente.
Ex-motorista de aplicativo, Daniel de Queiroz, de 30 anos, não passa mais por ali, apesar de a rodovia ser nova e não ter engarrafamento. Em novembro passado, ele caiu numa armadilha de criminosos quando trafegava com um passageiro. Após ter dois pneus furados, eles foram abordados por cinco bandidos armados na altura de Japeri, por volta das 23h. Sob ameaças e agressões, viveram momentos de terror.
— Passei por cima de um obstáculo preparado pelos bandidos, e dois pneus furaram. Fui obrigado a parar, mas já sabia que era um assalto. Minutos depois, cinco homens, bem agressivos, apareceram com armas. Deram um chute no rosto do passageiro, ameaçaram atirar e, depois de pegar nossos pertences, nos obrigaram a sair do local às pressas — contou Daniel, que correu por duas horas, em meio ao breu, até encontrar o primeiro refúgio, no bairro Amapá, em Caxias. — Aquela pista é muito perigosa, e eu não acreditava. A todo momento, achava que não ia sobreviver. Passei um sufoco, mas Deus me livrou. Agora, eu sei que ali é perigoso mesmo.
Gestor de segurança privada e especialista em roubos de carga, Rodrigo Gomes afirma que o Arco Metropolitano já não faz mais parte da rota de algumas transportadoras:
— Muitas empresas deixaram o itinerário e voltaram a trafegar pelas rodovias Presidente Dutra e Washington Luís, além da Avenida Brasil. Empresas que ainda passam pelo Arco usam escolta armada. O pior trecho é entre os municípios de Japeri e Paracambi, onde está a comunidade do Guandu, dominada por uma quadrilha especializada nesse tipo de crime.
Invasões ao redor
A insegurança não é problema recente. Em novembro de 2017, um policial civil foi baleado na cabeça durante um ataque de bandidos na altura de Japeri. Apesar da gravidade, Simon Bolívar Barreto Junior sobreviveu. Em maio do mesmo ano, dois seguranças de uma fabricante de cigarros morreram vítimas de um assalto. Jonas de Souza da Silva e Benedito Charles da Silva faziam a escolta da carga, alvo dos bandidos. Sete suspeitos do crime foram denunciados pelo Ministério Público do Rio.
Além da violência, a falta de manutenção agrava o cenário de abandono. Animais mortos, sinalização precária, radares de velocidade destruídos e mato invadindo a pista são obstáculos que motoristas enfrentam no percurso. Aqueles que se aventuram a cruzar a via sequer contam com um posto de gasolina ao longo dos mais de 70 quilômetros. Em Nova Iguaçu, Queimados e Belford Roxo, não há placas que informem a localização do motorista. Quem não estiver com um aparelho de GPS a bordo dificilmente consegue saber em que altura da Baixada Fluminense está trafegando.
O descaso é tão grande que vai além das pistas. A Câmara Metropolitana do estado detectou no ano passado 86 casas construídas irregularmente às margens da rodovia e a abertura ilegal de 79 acessos. A despeito dos dados alarmantes, o mapeamento realizado com o auxílio de drones foi suspenso desde que o Dnit assumiu a administração da estrada.
Ocupação irregular
Em junho do ano passado, O GLOBO esteve na região e flagrou um homem morando num barraco de madeira e lona na beira da via, na altura do quilômetro 56, em Nova Iguaçu. Na época, ele contou que era do Paraná e que estava tentando voltar para seu estado. Dez meses depois, o morador continua no mesmo lugar, mas sua casa ganhou mais espaço. Imagens aéreas feitas na última quinta-feira mostram o crescimento da ocupação irregular.
Procurado, o Dnit informou que obras de pavimentação previstas num convênio com o estado foram concluídas, restando alguns serviços como desapropriação, gestão ambiental e reflorestamento. Acrescentou que a contratação de empresa especializada para a prestação de serviços e obras de manutenção rodoviária ainda está em andamento.
Sobre o policiamento, a PRF afirmou que as equipes ficam baseadas em outras rodovias próximas ao Arco porque a segurança da via foi repassada para o órgão sem haver qualquer infraestrutura para a realização do trabalho.
Fonte: G1
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