Mosquitos transmitem doenças graves a pets e veterinária alerta para eliminação de criadouros
14 de março de 2020

Culex, Phlebotomus e Aedes aegypti são vetores de vermes e parasitas. Entre enfermidades, leishmaniose pode ser transmitida ao ser humano

Quando o executivo de contas Márcio Rebello adotou a pequena Liza, não imaginava que a cadelinha sofria de um problema mais grave do que uma pata quebrada. Após um ano entre idas e vindas ao veterinário, duas vezes por semana, a vira-lata morreu vítima de leishmaniose.

A doença infecciosa é causada por um parasita transmitido a cães, gatos e até ao ser humano pela picada de pernilongos da família dos flebotomíneos. Segundo a Fundação Oswaldo Cruz, o Brasil é o país que concentra o maior número de espécies desse inseto no mundo.

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“É uma doença muito grave, muito perigosa. Ficamos cuidando dela por um bom tempo, tratando várias doenças, mas não descobriam a leishmaniose. Quando descobriu, era tarde. Ela era um doce, muito boazinha, amorosa, um dengo em casa.”

Mas, a leishmaniose é só uma das doenças que podem ser transmitidas aos pets por mosquitos, como o Culex e o tão conhecido Aedes aegypti, que transmite o vírus da dengue ao ser humano e pode ser vetor do parasita da dirofilariose, que acomete cães e gatos.

Por esse motivo, a eliminação dos criadouros é fundamental não apenas para evitar a proliferação da dengue, do vírus da Zika, da Chikungunya e da Febre Amarela, mas também para proteger animais domésticos de diversas enfermidades.

 

Após a morte de Liza, a família de Márcio e outros dois cães que viviam com ele em Ribeirão Preto (SP) passaram a ser monitorados. Isso porque, a transmissão da leishmaniose é semelhante à da dengue: o mosquito pica um animal doente e se torna vetor da doença.

“A gente ficou um tempo em vigilância, porque essa doença pode passar para outros animais e até para a gente. Mas, não é comum de se ouvir. Eu ia mandar cremar o corpinho dela, mas a doutora pediu para deixar no hospital veterinário para fazer estudos”, diz.

Liza (direita) morreu após ser diagnosticada com leishmaniose em Ribeirão Preto — Foto: Márcio Rebello/Arquivo Pessoal

Liza (direita) morreu após ser diagnosticada com leishmaniose em Ribeirão Preto — Foto: Márcio Rebello/Arquivo Pessoal

Só em 2019, dez pessoas morreram em decorrência de leishmaniose visceral – o tipo mais agressivo da doença – em São Paulo, segundo a Secretarial Estadual da Saúde. Ao todo, 85 casos foram confirmados, sendo a maioria deles nas regiões de Marília (SP) e Araçatuba (SP).

Já a leishmaniose tegumentar americana, popularmente conhecida como Úlcera de Bauru, que causa feridas na pele e nas mucosas, levou a óbito três pessoas no estado de São Paulo no ano passado. O número de infectados, por sua vez, chegou a 315.

Por muito tempo, a única opção à leishmaniose era a eutanásia do animal infectado. Mas, um medicamento recém-aprovado pelo Ministério da Agricultura promete aumentar a expectativa de vida de cães e gatos, reduzindo a quantidade de parasitas no organismo.

 

Entretanto, a veterinária Roberta Casale, professora do Centro Universitário Moura Lacerda, destaca que não existe cura para essa doença. Uma vez infectado, o pet sempre carregará consigo o protozoário parasitário, mesmo sem apresentar os sintomas da doença.

“A eutanásia não é obrigatória. Mas, a pessoa tem que ter a consciência – principalmente se tiver criança ou idosos em casa – de que o animal pode significar a contaminação. É uma responsabilidade muito grande optar por tratar e manter esse animal”, afirma.

A veterinária Roberta Casale e os alunos do Centro Universitário Moura Lacerda em Ribeirão Preto — Foto: Juliano Gonçalves/G1

A veterinária Roberta Casale e os alunos do Centro Universitário Moura Lacerda em Ribeirão Preto — Foto: Juliano Gonçalves/G1

Segundo Roberta, o combate à leishmaniose é semelhante ao da dengue, ou seja, acabar com o vetor – nesse caso o Phlebotomus. Também conhecido como mosquito-palha, o inseto se reproduz em regiões úmidas e onde há matéria orgânica em decomposição.

“O animal continua sendo uma fonte de transmissão, mesmo sendo tratado, mesmo não tendo nenhum sinal clínico. Então, quando a gente vai tratar esse animal tem que atuar também e, principalmente, na prevenção do mosquito.”

Roberta destaca que em cães e gatos os mosquitos podem causar desde uma simples coceira, até quadros alérgicos e doenças graves. Além da leishmaniose, a dirofilariose é outra enfermidade preocupante, porque pode levar o animal à morte.

“A gente chama de verme do coração, porque é um verme mesmo, um verme redondo, e o local de predileção dele é o lado direito do coração. Com isso, causa problemas cardíacos bem graves. Existe tratamento, mas é bem difícil, cheio de efeitos colaterais”, detalha.

Mosquito-palha é transmissor do protozoário da leishmaniose em áreas urbanas — Foto: James Gathany/CDC

Mosquito-palha é transmissor do protozoário da leishmaniose em áreas urbanas — Foto: James Gathany/CDC

A região de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, não é considerada endêmica para esses tipos de doença porque, apesar de ter clima quente, as cidades não têm umidade suficiente para a reprodução dos insetos – a maioria opta por criadouros em água parada.

Isso não significa, porém, que o risco de contaminação seja menor, já que muitas famílias costumam levar os pets para passar as férias em outros municípios. Nesse caso, o uso de repelentes e coleiras inseticidas pode ser recomendável para proteger o animal.

“As áreas endêmicas são, geralmente, áreas litorâneas, praias, lagos. Se tenho um animal que vai passar as férias na praia, por exemplo, volta portando esse verme e acaba sendo picado por um mosquito, ele se contamina e pode contaminar outros animais também.”

Até hoje não há relatos de transmissão de dengue, vírus da Zika e chikungunya em cães e gatos. Entretanto, a veterinária afirma que vírus e parasitas podem se adaptar a outros ambientes e vetores. Assim, a eliminação dos insetos ainda é a melhor forma de prevenção.

“Apesar de a gente só ter notícias do isolamento da leishmânia no flebotomínio, nessa espécie de mosquito, por exemplo, existe uma chance grande de ter o Culex envolvido nisso também. É uma patogenia que não está totalmente esclarecida ainda”, afirma.

A professora Roberta Casale orienta os alunos no Centro Universitário Moura Lacerda em Ribeirão Preto — Foto: Juliano Gonçalves/G1

A professora Roberta Casale orienta os alunos no Centro Universitário Moura Lacerda em Ribeirão Preto — Foto: Juliano Gonçalves/G1

Fonte: G1