“Quando eu era garoto, sonhei em ser alguém na vida. Encontrei o esporte e o esporte me encontrou”, disse o ex-atleta
“No esporte, todos são iguais” – é o que diz uma das inscrições pintadas no Centro Olímpico da Ceilândia, região administrativa do Distrito Federal. Na prática, há várias distinções entre os esportistas. A maior delas, ter ganho uma medalha de ouro olímpica. Por isso, quando Joaquim Cruz chegou à pista de atletismo, no sábado (27), os meninos que treinavam por lá pararam para reverenciar o antigo campeão olímpico dos 800 metros, único atleta brasileiro a conquistar a medalha de ouro e a quebrar o recorde da prova numa olimpíada.
Já se passaram 32 anos desde que o meio-fundista brasileiro foi o mais rápido da prova, nos Jogos de Los Angeles, em 1984. Os 12 jovens que fazem parte do Instituto Joaquim Cruz – um projeto que dá treinamento especializado a futuros atletas nas provas de fundo do atletismo – sequer eram nascidos quando o ídolo corria para o ouro.
“Quando eu era garoto, sonhei em ser alguém na vida. Encontrei o esporte e o esporte me encontrou. E, através do esporte, pude expandir meus horizontes” – afirma o campeão de 1984, também medalha de prata da prova em Seul, em 1988, e por duas vezes campeão pan-americano – em Indianápolis, 1987, e Mar del Plata, 1995.
Na época, ele tinha 21 anos. Nasceu em 12 de março de 1963 em Taguatinga, sexto filho de um casal que migrou do Piauí para Brasília em busca de uma vida melhor. Vai completar 53 anos dentro de poucos dias e assumiu, voluntariamente, a responsabilidade de encontrar um talento que repita seu feito: “Aqui é um treinamento completo. Nós temos uma equipe multidisciplinar, com psicóloga, nutricionista, massagista, fisioterapeuta. Oferecemos condições para o garoto poder treinar com tranquilidade e competir internacionalmente” – diz Cruz. Para a atleta Karina Gualberto, de 19 anos, especialista na prova de 5 mil metros, o Instituto Joaquim Cruz é fundamental: “Aqui tem vale-transporte, vale-alimentação, uma bolsa atleta. Isso é bom. Ajuda bastante”.
Ao todo, apenas 12 atletas, entre 15 e 24 anos, estão ligados ao instituto. Os treinadores ainda buscam mais quatro talentos para completar a equipe, que treina diariamente na Ceilândia. Joaquim Cruz é um visitante raro. Morando em San Diego, nos Estados Unidos, vem no máximo duas vezes por ano conversar com os jovens do Projeto “Rumo ao Pódio Olímpico”. Como um pai atencioso, quer saber se a alimentação é a ideal, se o treino vai bem, qual a próxima competição em que o atleta vai participar.
Além disso, Cruz gosta de contar suas experiências, falar do passado, das dificuldades que enfrentou e de como conseguiu vencer na carreira: “Eu poderia estar nos Estados Unidos, cuidando da minha vida e virar as costas para o meu país. Mas aproveito de outra forma, tentando melhorar a vida dos garotos do meu país”.
A vida de José Miguel, de 16 anos, já está começando a mudar. Nesta semana, ele vai participar do Pan-Americano de Atletismo, na Venezuela. Será a primeira viagem internacional do jovem atleta, que confessa sua ansiedade: “Sempre tem aquele friozinho na barriga, aquele tremor, sair do país e representar o Brasil” .
A ideia de criar um instituto para treinar corredores surgiu quando Joaquim Cruz foi barrado pela alfândega brasileira. Isso ocorreu quando o ex-atleta tentou trazer 100 pares de tênis dos Estados Unidos para doar a jovens que praticavam o atletismo: “Cheguei à alfândega, o rapaz suspeitou que eu estava trazendo os tênis para comercializar e segurou meus tênis”. A partir daí, Joaquim criou uma organização e passou a trazer “legalmente” 200 pares de tênis toda vez que vinha ao Brasil.
Fora das pistas desde que se aposentou em 1997, Joaquim Cruz vê no instituto o prolongamento de sua carreira, uma espécie de pagamento de dívida com a cidade onde nasceu e cresceu: “Tento devolver para a comunidade, o que a comunidade de Taguatinga fez por mim. Essa é uma forma de poder falar muito obrigado a essa gente”.
Rio 2016
Indagado se será escolhido para acender a pira dos Jogos Olímpicos este ano (tal como ocorreu no Pan-Americano do Rio, em 2007), Joaquim Cruz desconversou e disse que já é uma honra muito grande ver o Brasil sediando uma Olimpíada. A cerimônia de abertura ocorrerá no Maracanã, no dia 5 de agosto, e o nome do ex-atleta escolhido para o ato pelo Comitê Organizador ainda é segredo guardado a sete chaves.
Em relação às chances de medalhas do atletismo brasileiro, Cruz destaca apenas a saltadora Fabiana Murer (salto com vara). Ele acredita que a equipe de revezamento masculino do 4 x 100 pode alcançar o pódio, desde que esteja em um dia bom. Fora isso, o campeão olímpico vê a Confederação Brasileira de Atletismo e os próprios clubes com dificuldade de identificar atletas de qualidade para subir ao pódio. Nos Jogos Olímpicos de Londres em 2012, por exemplo, o Brasil voltou sem ganhar medalha nas 47 provas de atletismo.
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