As farmacêuticas bloqueiam medicamentos que curam: “Advinha porque?”
22 de novembro de 2015

As grandes industrias farmacêuticas bloqueiam medicamentos que curam, porque não são rentáveis

O Prêmio Nobel da Medicina Richard J. Roberts denuncia a forma como funcionam as grandes farmacêuticas dentro do sistema capitalista, preferindo os benefícios econômicos à saúde, e detendo o progresso científico na cura de doenças, porque a cura não é tão rentável quanto a cronicidade.

Em matéria por mim publicada neste portal com o título Rede Globo e Dráuzio Varella se vendem ao Lobby nojento e orquestrado das indústrias químicas e farmacêuticas” abordei o boicote que grandes indústrias químicas e farmacêuticas desempenhavam para impedir que uma substância visse a ser registrada como medicamento, por não interessar economicamente a eles.

Isso se deu em virtude à grande repercussão da fosfoetanolamina sintética como possível medicamento para combater o câncer. Travou-se uma verdadeira cruzada contra a substância a ponto do Poder Judiciário ter sido chamado a intervir.

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Atualmente, por decisão judicial, a substância foi barrada e sua distribuição suspensa, indo de encontro às esperanças existentes em milhares de enfermos desta nefasta doença.

Entre a legalidade (exigências burocráticas) e a saúde, por maioria de votos festejou-se a legalidade, ou seja entre dois princípios constitucionais, prevaleceu aquele que não importa aos pacientes, parte fraca nesta queda de braço. Cria-se a dificuldade para vender a facilidade posteriormente.

No entanto, deixando de lado paixões mais efervescentes, repletas de opiniões contrarias e a favoráveis, uma entrevista bombástica nos remete a uma reflexão a respeito do tema “boicote”.

Há pouco, foi revelado por uma reconhecida autoridade na área da saúde, que asgrandes empresas farmacêuticas dos EUA gastam centenas de milhões de dólares por ano em pagamentos a médicos que promovam os seus medicamentos. (embora não dito, no Brasil também ocorre o mesmo)

Para complementar, reproduzimos esta entrevista com o Prémio Nobel Richard J. Roberts, que diz que os medicamentos que curam não são rentáveis e, portanto, não são desenvolvidos por empresas farmacêuticas que, em troca, desenvolvem medicamentos cronificadores que sejam consumidos de forma serializada. Isto, diz Roberts, faz também com que alguns medicamentos que poderiam curar uma doença não sejam investigados. E pergunta-se até que ponto é válido e ético que a indústria da saúde se reja pelos mesmos valores e princípios que o mercado capitalista, que chega a assemelhar-se ao da máfia.

Leiam a entrevista e tirem suas conclusões, não se esquecendo que as afirmações sobre esta nojenta prática não são feitas por qualquer curioso, mas sim pelo nada mais, nada menos do que o Prémio Nobel da Medicina Richard J. Roberts.

A investigação pode ser planeada?

Se eu fosse Ministro da Saúde ou o responsável pelas Ciência e Tecnologia, iria procurar pessoas entusiastas com projectos interessantes; dar-lhes-ia dinheiro para que não tivessem de fazer outra coisa que não fosse investigar e deixá-los-ia trabalhar dez anos para que nos pudessem surpreender.

Parece uma boa política.

Acredita-se que, para ir muito longe, temos de apoiar a pesquisa básica, mas se quisermos resultados mais imediatos e lucrativos, devemos apostar na aplicada…

E não é assim?

Muitas vezes as descobertas mais rentáveis foram feitas a partir de perguntas muito básicas. Assim nasceu a gigantesca e bilionária indústria de biotecnologia dos EUA, para a qual eu trabalho.

Como nasceu?

A biotecnologia surgiu quando pessoas apaixonadas começaram a perguntar-se se poderiam clonar genes e começaram a estudá-los e a tentar purificá-los.

Uma aventura.

Sim, mas ninguém esperava ficar rico com essas questões. Foi difícil conseguir financiamento para investigar as respostas, até que Nixon lançou a guerra contra o cancro em 1971.

Foi cientificamente produtivo?

Permitiu, com uma enorme quantidade de fundos públicos, muita investigação, como a minha, que não trabalha directamente contra o cancro, mas que foi útil para compreender os mecanismos que permitem a vida.

O que descobriu?

Eu e o Phillip Allen Sharp fomos recompensados pela descoberta de introns no DNA eucariótico e o mecanismo de gen splicing(manipulação genética).

Para que serviu?

Essa descoberta ajudou a entender como funciona o DNA e, no entanto, tem apenas uma relação indirecta com o cancro.

Que modelo de investigação lhe parece mais eficaz, o norte-americano ou o europeu?

É óbvio que o dos EUA, em que o capital privado é ativo, é muito mais eficiente. Tomemos por exemplo o progresso espetacular da indústria informática, em que o dinheiro privado financia a investigação básica e aplicada. Mas quanto à indústria de saúde… Eu tenho as minhas reservas.

Entendo.

A investigação sobre a saúde humana não pode depender apenas da sua rentabilidade. O que é bom para os dividendos das empresas nem sempre é bom para as pessoas.

Explique.

A indústria farmacêutica quer servir os mercados de capitais…

Como qualquer outra indústria.

É que não é qualquer outra indústria: nós estamos a falar sobre a nossa saúde e as nossas vidas e as dos nossos filhos e as de milhões de seres humanos.

Mas se eles são rentáveis investigarão melhor.

Se só pensar em lucros, deixa de se preocupar com servir os seres humanos.

Por exemplo…

Eu verifiquei a forma como, em alguns casos, os investigadores dependentes de fundos privados descobriram medicamentos muito eficazes que teriam acabado completamente com uma doença…

E por que pararam de investigar?

Porque as empresas farmacêuticas muitas vezes não estão tão interessadas em curar as pessoas como em sacar-lhes dinheiro e, por isso, a investigação, de repente, é desviada para a descoberta de medicamentos que não curam totalmente, mas que tornam crónica a doença e fazem sentir uma melhoria que desaparece quando se deixa de tomar a medicação.

É uma acusação grave.

Mas é habitual que as farmacêuticas estejam interessadas em linhas de investigação não para curar, mas sim para tornar crónicas as doenças com medicamentos cronificadores muito mais rentáveis que os que curam de uma vez por todas. E não tem de fazer mais que seguir a análise financeira da indústria farmacêutica para comprovar o que eu digo.

Há dividendos que matam.

É por isso que lhe dizia que a saúde não pode ser um mercado nem pode ser vista apenas como um meio para ganhar dinheiro. E, por isso, acho que o modelo europeu misto de capitais públicos e privados dificulta esse tipo de abusos.

Um exemplo de tais abusos?

Deixou de se investigar antibióticos por serem demasiado eficazes e curarem completamente. Como não se têm desenvolvido novos antibióticos, os micro organismos infecciosos tornaram-se resistentes e hoje a tuberculose, que foi derrotada na minha infância, está a surgir novamente e, no ano passado, matou um milhão de pessoas.

Não fala sobre o Terceiro Mundo?

Esse é outro capítulo triste: quase não se investigam as doenças do Terceiro Mundo, porque os medicamentos que as combateriam não seriam rentáveis. Mas eu estou a falar sobre o nosso Primeiro Mundo: o medicamento que cura tudo não é rentável e, portanto, não é investigado.

Os políticos não intervêm?

Não tenho ilusões: no nosso sistema, os políticos são meros funcionários dos grandes capitais, que investem o que for preciso para que os seus boys sejam eleitos e, se não forem, compram os eleitos.

Há de tudo.

Ao capital só interessa multiplicar-se. Quase todos os políticos, e eu sei do que falo, dependem descaradamente dessas multinacionais farmacêuticas que financiam as campanhas deles. O resto são palavras…

E aqui?

Fonte:http://tarabori.jusbrasil.com.br/noticias/255966700/as-grandes-industrias-farmaceuticas-bloqueiam-medicamentos-que-curam-porque-nao-sao-rentaveis?utm_campaign=newsletter-daily_20151116_2286&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Publicado originalmente no La Vanguardia

Nadir Tarabori

Nadir Tarabori

Consultor Legal – Direito Estratégico

Formado pela Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie – Membro Efetivo da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo – Mestrado em Ciências Penais pela Université Paris – Panthéon – Sorbone.

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