Conforme mencionamos outro dia no artigo “O Promotor de Justiça e a Ótica Social”, vamos falar hoje dos crimes que vão a julgamento no Tribunal do Júri no Brasil.
Ao contrário do que podemos imaginar, nem todos os crimes cometidos são julgados pelo Tribunal do Júri. Em verdade, a grande parte dos crimes são julgados pelo juizsingularmente, ou seja, sozinho.
Quando o julgamento é pelo Júri, dizemos que há um julgamento colegiado, pois são sete os jurados.
Bem, sobre o Júri, a Constituição Federal de 5 de outubro de 1.988 disciplina:
“(…) Art. 5º. XXXVIII – e reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida; (…)”.
O que importa para o tema de hoje é a alínea (letra) d, na qual a Constituição Federaldetermina que o Júri julga os crimes dolosos contra a vida.
Mas quais são os crimes dolosos contra a vida? Para essa resposta, vamos ter de nos reportar ao Código Penal porque o cabeçalho do art. 5º, inciso XXXVIII, CF, remeteu a organização do júri à Lei. Pois é, o Código Penal é uma Lei e é ele quem diz quais são os crimes dolosos contra a vida, que são os previstos do artigo 121 até o artigo 126. São eles:
1. Homicídio – uma pessoa mata ou tenta matar a outra (não se trata aqui do homicídio culposo, pois a Constituição Federal só fala no doloso, ou seja, o que tem intenção de fazer);
2. Induzimento, instigação ou auxílio por terceiro a suicídio – esclareça-se que não é crime a pessoa suicidar1, mas sim o ato de terceiro induzir, instigar ou auxiliar o suicida, culminando com sua morte ou com lesão grave nele;
3. Infanticídio – é a mãe matar ou tentar matar o próprio filho durante o parto ou logo após este sob a influência do estado puerperal;
4. Aborto provocado pela gestante OU com seu consentimento – sanção penal para a gestante;
5. Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante – sanção penal só para o agente provocador; e
6. Aborto provocado com o consentimento da gestante – sanção penal para quem provoca o aborto.
Desse modo, são estes os crimes que vão a julgamento pelo Tribunal do Júri.
Com esta afirmação podem me perguntar: ora, como assim, eu já vi estuprador sendo julgado pelo Tribunal do Júri?
Sim, o afirmado é a regra. Contudo, como toda boa regra, ela comporta exceções, a exemplo de quando um destes crimes é cometido juntamente com outro que não é doloso contra a vida, este vai ser julgado no Júri junto ao primeiro.
Dessa forma, por exemplo, se um homicídio é praticado no mesmo contexto de um estupro, o homicídio faz com que o estupro seja julgado pelo Tribunal do Júri também. É o caso do criminoso que estupra e mata.
Este exemplo vale para outros crimes também. Saliente-se que existem várias outras situações em que alguns crimes que não são, em princípio, de competência do Tribunal do Júri, e este acaba por julgá-los. Entretanto, reitere-se, são exceções.
Para complicar um pouquinho, observamos que os crimes os dolosos contra a vida, em alguns casos, não são julgados pelo Júri.
Nestas situações, ocorrem exceções ao contrário. É o que se dá, por exemplo, quando uma autoridade com foro de prerrogativa de função (o famigerado foro privilegiado) comete um daqueles crimes, ela é julgada pelo tribunal que é competente para julgá-lo.
É caso típico de não julgamento pelo Tribunal do Júri o de um Deputado Federal ou Senador da República que comete um homicídio.
Como eles têm foro por prerrogativa de função (que explico em outro artigo), são julgados pelo Supremo Tribunal Federal (art. 102, inciso I, b2, CF88).
Existem outras hipóteses de foro por prerrogativa por função além das duas autoridades citadas.
Feitas estas explanações, vamos por as ideias em ordem para não ficarem confusas:
1. Em regra, só os crimes dolosos contra a vida são julgados pelo Tribunal do Júri;
2. A regra acima comporta exceções, que são os crimes que são cometidos no mesmo contexto que um doloso contra a vida;
3. Mesmo um crime doloso contra a vida, se cometido por autoridade que tenha foro por prerrogativa de função, é julgado pelo tribunal que é competente para tal.
Assim, com estes poucos esclarecimentos, esperamos ter contribuído para tirar algumas dúvidas recorrentes sobre a área jurídica e que não são tão simples a quem não é bacharel em direito ou não trabalha nos fóruns.
Esclareça-se que este artigo não tem objetivo de ter purismo técnico, pois é voltado para todos os leitores indistintamente. Sabemos que as explicações aqui lançadas são simples para quem é da área jurídica, no entanto são novidades a maioria dos leitores.
Não pretendemos com essas explicações desprestigiar o leitor que já conhece o assunto, mas sim permitir que o leitor estranho ao direito tenha acesso a algumas informações muito restritas.
Esperamos que compreendam essa intenção e continuem frequentando o blog.
Voltamos em breve com um novo tema.
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