Alunos de Medicina Veterinária farão manifestação expondo problemas da Rural
26 de março de 2019

Está planejado para esta semana, no pavilhão principal Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), um ato para protestar e expor problemas que a Rural vem enfrentando nos últimos tempos. O principal motivo é o estado do Hospital Veterinário, que passou por um incêndio ano passado.

“O Hospital é voltado para o atendimento de animais da população da cidade e arredores, além de servir para estágios, programas de residência e aulas práticas, fora o desenvolvimento de pesquisas e trabalhos. O problema principal é que em outubro do ano passado teve um incêndio na parte elétrica do hospital, fazendo com que ele fechasse as portas, hoje o hospital está atendendo de forma precária e apenas consultas de rotina, fugindo da sua proposta inicial, pois os casos de emergências são negados, e isso tudo com o risco de um novo incêndio. Mediante isso, o Diretório Acadêmico de Medicina Veterinária junto ao corpo discente pretende fazer uma manifestação semana que vem na Universidade em frente ao prédio do reitor. Gostaríamos de convidar a imprensa para aumentar a comoção e tentar chegar a uma solução para o nosso problema”, disse uma aluna da Rural, que preferiu não se identificar.

O Diretório da Rural emitiu uma carta à imprensa, detalhando as dificuldades que a Universidade vem passando. A reportagem fez contato com a diretoria da UFRRJ, contudo, não obteve retorno.

A carta na íntegra

Nós, alunos da faculdade mais antiga do Brasil, com seus 119 anos de história sendo jogados no ralo, cujo curso é tido como o sétimo colocado em um país com mais de 300 outras instituições, por meio deste comunicado denunciamos a situação de precarização e abandono que encontramos em nosso curso e em suas dependências. Em outubro de 2018, o Hospital Veterinário da UFRRJ (HVPA) sofreu um curto circuito seguido de princípio de incêndio. Felizmente, a situação fora, rapidamente, controlada evitando-se danos adicionais. Dessa intercorrência foram constatadas avarias que afetaram mais de 50% da rede elétrica da unidade. Passados mais de cinco meses do ocorrido, o prazo para o término do conserto e readequação da rede elétrica do HVPA já acabou e, no entanto, a obra nem mesmo foi iniciada. Ademais, é importante salientar que a precariedade da situação não é algo exclusivo dos últimos dias e meses. Ironicamente, o fato fica ainda mais evidenciado se levarmos em conta eventos recentes na história do Instituto e do Hospital como os descritos a seguir.

Existe um problema histórico na instituição envolvendo o contato com a reitoria. Há relatos e registros de inúmeros memorandos e solicitações de obras e ajustes da rede elétrica do Hospital que remontam a 2015. Os alunos, residentes, estagiários, funcionários, proprietários e animais estavam e ainda estão expostos a constantes riscos de incêndios devido a condição do quadro de disjuntores (com estrutura de cerca de 4 décadas atrás) que permitem o aquecimento dos fios, pois estão mal dimensionados. O HVPA chegou a ser paralisado por duas semanas em maio de 2018 por problemas elétricos. Foi feita uma substituição por um equipamento inadequado, que permitiu a volta das atividades até outubro, onde o fatídico princípio de incêndio aconteceu durante o expediente do hospital. O acidente teve suas proporções controladas apenas pela intervenção de um proprietário que se utilizou de um extintor para resolver a situação. É importante lembrar que ninguém do corpo laboral do Hospital passa por nenhum tipo de treinamento para situações do tipo: as consequências poderiam ter sido trágicas. Desde então, o HVPA segue parado, com um funcionamento mínimo, longe de cobrir a enorme demanda. A casuística caiu de 120 casos por dia para 30. À medida que os dias passavam, reuniões entre os representantes da empresa, os mediadores de contrato e entre a direção do Hospital e do Instituto de Veterinária aconteciam, e promessas eram feitas de que o material já estava comprado, e as obras estavam na iminência de começar. Algumas vezes, foi dito que a obra já estava em andamento. Ambas as direções, junto à reitoria, aos alunos e os professores, foram enganados com essas promessas por meses.

Até que o reitor, pouco antes de comparecer a reunião do dia 26 de fevereiro, descobriu as mentiras, e que a obra não poderia começar, pois a empresa terceirizada responsável pelas reparos estava sem pagamento por parte da universidade há mais de 5 meses, e entre a compra de material e o pagamento de pessoal, a empresa optou por manter o salário de seus funcionários. No dia 26 de fevereiro, foi finalmente convocada a reunião do CONSUNI com o reitor, que afirmou ter sido feito o pagamento de alguns meses para a empresa e foi estabelecido um prazo para que as obras começassem (este foi o último prazo dado para a comunidade da veterinária, prazo este que não foi respeitado). Desde então, as últimas atualizações têm sido conversas de corredor em que se sugerem reparos temporários no lugar da obra, assim como foi feito em maio, quando a real necessidade envolve dimensionamento de carga, troca de fiações e disjuntores compatíveis com a tensão demandada pela vivência hospitalar e do Instituto. Estas intervenções “menores” sugeridas são altamente questionáveis e apenas manteriam parcialmente o funcionamento do recinto e a segurança das pessoas que nele permanecem em constante risco novamente. Outra prática lamentável é o uso de outra obra em andamento no HVPA, esta por sua vez obtida através de emenda parlamentar, com orçamento e projetos já licitados e fechados, para maquiar a situação do quadro elétrico do hospital e do instituto. Essa obra nada tem a ver com isso, assim como sua verba não pode ser redirecionada para solucionar os problemas aqui apresentados. Seguimos em situações perigosas e absurdas, como o inimaginável caso de dois andares inteiros do institutos ligados por um mesmo disjuntor arcaico, entre outras coisas.

A saber, o Hospital Veterinário de Pequenos Animais, desempenha papel essencial na formação dos discentes da graduação, dos programas de residência, mestrado e doutorado da medicina veterinária, sendo, praticamente, impossível imaginar a existência plena do curso (lembrando – trata-se de um curso de medicina) sem a manutenção das atividades do hospital veterinário. A previsão é de que passemos mais de 1 ano sem acesso a aulas práticas, as quais são tidas como importantíssimas, como cirurgia, as clinicas, e assim como outras disciplinas que dependem da rotina do HVPA para terem material de estudo. Turmas inteiras se formarão sem esses conhecimentos, o que pode impactar o mercado de trabalho negativamente. Além disso, um de nossos maiores marcos é prestar serviços de qualidade e a preços acessíveis ao município e populações adjacentes, o que reforça que a demora na resolução do caso exposto tem gerado agravos imensuráveis e crescentes não só no âmbito acadêmico, como também no contexto social, uma vez que acarreta inúmeras vidas perdidas de animais que não conseguem o atendimento necessário e, muita vezes, emergencial.

Certamente, sabemos que estamos em um momento delicado na educação pública nacional, com contenção de verbas, demissões em massa, e instituições cada vez mais sucateadas e sem a devida atenção do governo. Mas não podemos deixar de mencionar que durante as campanhas de eleição para Reitoria, os candidatos estavam cientes das problemáticas com as quais teriam de lidar. E, frente a isso, nós, do curso de medicina veterinária, apontamos uma ineficiência de nossa reitoria na resolução dos problemas. Apesar das limitações, acreditamos que existem, sim, medidas que podem ser tomadas para contornar os problemas, de modo que seja possível cobrar, com firmeza, às devidas partes ações já prometidas e não cumpridas no intuito de se resolver o problema. Ademais, apontamos que existe certa morosidade nas respostas institucionais nas quais, basicamente, afirmam estar de mãos atadas frente ao possível fim de nossas atividades acadêmicas.

Compreendemos, também, que essa problemática da universidade é apenas uma entre várias já bem conhecidas de qualquer aluno em qualquer curso da UFRRJ, contudo, isso compõe um quadro geral de enorme precariedade de infraestrutura em todos os quesitos básicos para o pleno exercício da atividade acadêmica e manutenção/permanência de alunos e funcionários. Por isso, ao nos encontrarmos em um ponto crítico, viemos a público expressar nossas sinceras preocupações com relação ao futuro de quase 1000 alunos.

Como representantes da comunidade discente da medicina veterinária, nós, o Diretório Acadêmico Guilherme Hermesdorff, expomos a seguir uma parcela dos prejuízos que há mais de cinco meses fazem-se presentes em nossa realidade:

• Setores inteiros do programa de residência estão impedidos de exercerem suas funções, tendo suas formações completamente prejudicadas, com risco do MEC fechar o programa a qualquer momento por não cumprimento de horas; bilizando por completo a formação profissionalizante na área médica;
• Os Programas de Aprendizagem Prática da área médica profissionalizante encontram-se inviabilizados;
• Os Estágios Curriculares Supervisionados na área médica profissionalizante estão impedidos de serem realizados dentro da Instituição.
• Diversos setores da Universidade cujos serviços são vinculados ao HVPA estão com suas atividades defasadas;
• Cursos de aprimoramento na área médica profissionalizante estão suspensos;
• Estágios extracurriculares no HVPA encontram-se inviabilizados (alunos de outras instituições que procuram o hospital estão tendo seus pedidos negados);

A situação atual é insustentável e a Medicina Veterinária da UFRRJ mostra não ter condições de continuar suas atividades no cenário apresentado. Além disso, é importante notar que os estudantes de baixa renda têm sido também afetados de forma ainda mais intensa, pois muitos não se encontram em condições materiais de realizar o Estágio Curricular em outros municípios, e, de forma geral, as clínicas particulares de Seropédica e da Baixada Fluminense não apresentam casuística suficiente para formar médicos veterinários de qualidade.

Acreditamos que, ao expor e conscientizar a sociedade de nossos problemas, geramos mais chances de nos aproximarmos de uma resolução. Contamos com a ajuda da imprensa para fazer eco às nossas reivindicações, e assim permitir que a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro possa voltar a contribuir socialmente provendo profissionais de excelência em um curso de ponta, como diz a reputação nacional e internacional da instituição, sempre lembrada como referência em ensino e vivência por todos que conhecem os frutos de seu trabalho.

Atenciosamente,
Diretório Acadêmico Guilherme Hermesdorff