Órgão de vigilância midiática da Rússia, colocou na lista negra pelo menos cinco meios de comunicação ligados ao chefe do grupo mercenário
Essa ação ocorreu depois que o grupo paramilitar avançou em direção a Moscou no que pareceu ser uma tentativa de insurreição.
A partir deste sábado, 1, os sites da agência de notícias RIA FAN e outros quatro portais de notícias online controlados pelo Patriot Media Group, ligada a Prigozhin, foram inseridos na lista negra mantida pelo Serviço Federal de Supervisão de Comunicações da Russia.
Os portais são People’s News, Neva News, Politics Today e Economy Today. A imprensa local veiculou nesta sexta, 30, que o próprio Prigozhin ordenou que a sede do Patriot em São Petesburgo fosse fechada. A informação não foi negada nem confirmada pelo líder.
O Patriot foi fundado em 2019 para reunir os meios de comunicação de Prigozhin e incluía a Internet Research Agency, apelidada de “fazenda de trolls”, que teve relação com a tentativa da Rússia de interferir nas eleições americanas a favor de Donald Trump em 2016.
Líder sai ileso
O líder mercenário Yevgeny Prigozhin comandou uma rebelião armada contra os militares russos – e saiu ileso. Outros que apenas expressaram críticas contra o Kremlin não tiveram a mesma sorte.
O Kremlin havia prometido não submeter Prigozhin a um processo criminal, depois de entrar em um acordo para que ele interrompesse a insurreição e se retirasse para a vizinha Belarus. O acordo se deu apesar da promessa do presidente Vladimir Putin de punir os responsáveis pela rebelião.
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Diante de uma pergunta da Associated Press sobre essa guinada, durante uma teleconferência com repórteres na terça-feira, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, se recusou a comentar.
Que Prigozhin tenha conseguido escapar do julgamento, pelo menos por enquanto, é um duro contraste com a forma como o Kremlin vem lidando com protestos contra o governo, como expressar oposição à guerra na Ucrânia ou questionar o domínio de Putin.
Peskov, em resposta a uma pergunta sobre o assunto, mencionou “a vontade (de Putin) (…) de evitar que os eventos se desenrolassem conforme o pior cenário possível”, além das promessas e garantias oferecidas a Prigozhin.
Acusação seletiva
Ivan Pavlov, um importante advogado que já atuou em casos de grande repercussão envolvendo o FSB, contou à AP que “as leis não funcionam na Rússia, e quando funcionam, é muito seletivo.”
O motivo, segundo Pavlov, é a “conveniência política”. Que o processo contra Prigozhin tenha sido arquivado é “nada menos que uma vergonha”. O líder oposicionista Alexei Navalny, preso, foi jogado em uma cela solitária na colônia penal onde está cumprindo nove anos de pena, por pequenas transgressões de regras prisionais.
“Eu adoraria ver a cara de Navalny na próxima audiência judicial sobre abotoamento incorreto (de seu uniforme) quando souber que um processo de rebelião armada foi arquivado porque a pessoa envolvida nele concordou em ir embora para Belarus”, disse Georgy Alburov, aliado de Navalny, em um tweet, na terça.
Quando Navalny foi informado sobre a rebelião por seus advogados durante uma audiência judicial, ele disse ter achado que era uma piada.
“Eles estavam me contando sobre a tomada de Rostov, os helicópteros abatidos, e a coluna armada seguindo em direção a Moscou (…) Fiquei esperando alguém gritar de repente, ‘É uma pegadinha!’. Mas ninguém gritou”, disse Navalny em uma publicação nas redes sociais.
Por outro lado, Prigozhin tinha ligações de longa data com Putin, e obteve lucrativos contratos de fornecimento para o Kremlin antes de fundar a empresa militar privada Wagner, que já enviou forças para a Síria, países africanos e a Ucrânia.
Desacreditar o exército
Espalhar publicamente “informações falsas” sobre o exército russo ou “desacreditar” a instituição se tornou crime uma semana depois que o Kremlin enviou suas tropas para a Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022.
As autoridades usam a legislação para reprimir qualquer um que se manifeste contra a guerra ou se afaste da narrativa oficial.
A repressão está se espalhando pela Rússia, e as forças de segurança estão perseguindo tanto importantes figuras de oposição quanto cidadãos comuns.
Ilya Yashin, político de oposição, foi condenado a 8 anos e meio de prisão pela acusação de condenar as atrocidades cometidas por soldados russos no subúrbio de Bucha, em Kiev. Um colega do conselho municipal de Moscou, Alexei Gorinov, foi condenado a sete anos pelas mesmas acusações.
Em uma publicação feita no Facebook por sua equipe jurídica, Yashin comentou que Prigozhin “esfregou a cara de toda a liderança militar no asfalto, capturou uma cidade e disparou contra aeronaves militares russas”.
Mas observou que ele mesmo, Gorinov, e Evgeny Roizman, uma figura de oposição, “ainda são os que desacreditam o exército. Claro.”
Sasha Skochilenko, uma artista de São Petersburgo, está sendo julgada por substituir pequenas etiquetas de preço em um supermercado por slogans contra a guerra.Ela passou mais de um ano em prisão preventiva, e pode enfrentar até 10 anos de prisão se for condenada.
Um pai solteiro na região de Tula, ao sul de Moscou, foi condenado a dois anos de prisão depois que sua filha adolescente fez uma pintura contra a guerra na escola.
Segundo o OVD-Info, um importante grupo russo de defesa de direitos que oferece assistência jurídica, até o final de junho 603 pessoas estavam enfrentando acusações criminais por posicionamentos contrários à guerra.
Muitas foram multadas por protestos contra a guerra, que as autoridades consideram desacreditar o exército – inclusive aquelas que carregavam pedaços de papel em branco ou o romance de Leon Tolstói, “Guerra e paz”.
Prigozhin, que por meses criticou publicamente a liderança militar com insultos cheios de palavrões nas redes sociais, nunca enfrentou essas acusações.
Vandalizar centros de alistamento
Prigozhin também admitiu que seus combatentes atingiram aeronaves militares russas durante a revolta, levando à morte das pessoas a bordo.
Vários russos que arremessaram coquetéis Molotov, ou tentaram de alguma forma incendiar os centros de alistamento militar como parte da expressão de sua indignação contra a guerra, foram condenados a longas penas de prisão, embora esses atos raramente tenham causado grandes danos.
Desde o início da guerra, a mídia russa noticiou pelo menos 77 tentativas de atear fogo em centros de alistamento. Muitas resultaram em condenações.
A pena mais longa até agora, de 19 anos, foi dada a Roman Nasryev e Alexei Nuriyev, acusados de atirar coquetéis Molotov contra um centro de alistamento na cidade de Bakal, na região de Chelyabinsk. O incêndio foi pequeno e ninguém se feriu, segundo as notícias.
Nasryev disse em juízo que estava expressando seu “desacordo com a operação militar especial”, o termo usado pelo Kremlin para a guerra na Ucrânia.
Kiril Butylin, um encanador de uma cidade nos arredores de Moscou, recebeu uma pena de 13 anos. Ele foi acusado de vandalismo, incitação pública a atividade terrorista e ato terrorista, após pintar uma bandeira ucraniana e escrever um slogan contra a guerra na parede de um centro de alistamento, além de arremessar dois coquetéis Molotov.
As penas para outras pessoas que tentaram incendiar esses centros variaram entre 1 ano e meio e 12 anos.
Acusações de traição
Em um discurso à nação no sábado, 24, Putin usou o termo “traição” para se referir à rebelião de Prigozhin. É um delito grave na Rússia, que é julgado em sigilo e quase nunca resulta em absolvição.
Nos últimos anos, essa acusação foi usada contra críticos ao Kremin, cientistas trabalhando em pesquisas internacionais, e mais recentemente, russos que se opõem à guerra e doam dinheiro para apoiar o exército ucraniano.
Na segunda-feira, 26, Valery Golubkin, um cientista aeroespacial de 70 anos, foi condenado por traição, e recebeu uma pena de 12 anos por entregar segredos de Estado a representantes de organizações estrangeiras.
Golubkin insistiu em sua inocência, e seus advogados argumentam que ele estava trabalhando em um projeto internacional, e tinha permissão para compartilhar dados com seus parceiros estrangeiros.
No começo deste ano, Vladimir Kara-Murza Jr., uma das principais figuras de oposição, foi condenado por traição por denunciar a guerra em público, e recebeu uma pena de 25 anos de prisão.
No ano passado, o ex-jornalista Ivan Safronov foi condenado a 22 anos de prisão por traição, por repassar segredos militares para a inteligência tcheca e um cidadão alemão.
Safronov insistiu em sua inocência, e muitos jornalistas russos consideram que o processo contra ele foi uma vingança por suas reportagens que expuseram questionáveis transações com armas.
Fonte: Correio do Estado
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