Expansão do teste do pezinho faz exame prevenir 51 doenças
22 de junho de 2022

Ampliação do exame que detecta doenças raras em estágio precoce é medida fundamental para garantir qualidade de vida

A expansão do teste do pezinho para abranger mais doenças na rede pública é um avanço importante, e necessário, no tratamento de doenças identificadas ainda nas primeiras semanas de vida da criança. A legislação prevê uma implementação em etapas do teste ampliado, aumentando gradualmente a quantidade de doenças testadas na triagem neonatal. Mas, na avaliação de especialistas e de familiares, ainda há muito a evoluir nesse caminho.

O Correio realizou, ontem, o CB.Fórum Ampliação do teste do pezinho: um passo fundamental para o diagnóstico precoce de doenças raras para discutir o tema. O evento contou com a presença de médicos, gestores em saúde pública e uma mãe de crianças com doença rara, detectável pelo teste.

“Atualmente nós temos seis doenças contempladas pelo teste do pezinho. Alguns municípios já adotaram o teste ampliado, com mais de 50 doenças, mas isso ainda não é uma realidade nacional”, explicou o neurologista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Edmar Zanotelli.

O primeiro painel do evento debateu a importância do teste do pezinho e de sua ampliação. Além de Zanotelli, participaram do encontro o presidente da Casa Hunter, Antoine Souheil Daher; a coordenadora do Programa de Triagem Neonatal da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo, Carmela Grindler; e Suhellen Oliveira, mãe de dois pacientes com atrofia muscular espinhal (AME).

 

brasil-teste-pezinho
brasil-teste-pezinho(foto: brasil-teste-pezinho)

Expansão gradual

O teste do pezinho foi trazido ao Brasil em 1976 pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), chamado de screening neonatal. Ele foi incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS) em 1992 e, desde então, passou a ser obrigatório e gratuito para todos os recém-nascidos.

Atualmente, na rede pública, o teste é capaz de detectar seis doenças: fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, doença falciforme e outras hemoglobinopatias, fibrose cística, hiperplasia adrenal congênita e deficiência de biotinidase. Com a evolução da tecnologia, especialmente no campo da genética, já é possível detectar um número muito maior de doenças a partir de gotas de sangue coletadas do calcanhar da criança.

Em maio do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou a Lei 14.154/21, que prevê a ampliação em etapas da oferta de exames pelo teste do pezinho na rede pública. Segundo a lei, o cronograma para a implantação deve ser definido pelo Ministério da Saúde, mas até hoje isso não ocorreu. Alguns estados, como o Distrito Federal e São Paulo, já oferecem o exame ampliado.

A cada uma das cinco etapas previstas na lei, mais doenças farão parte do rol de testagem, até a conclusão com a AME. A doença é a mais recente a ser detectada pelo teste do pezinho, por meio de análise do material genético da criança presente na gota de sangue coletada. No Brasil, cerca de 1 em cada 10 mil nascidos têm AME.

“O teste do pezinho não é um exame, é um programa público de assistência”, afirma a coordenadora do programa de Triagem Neonatal da Secretaria de Saúde do estado de São Paulo (SES/SP), Carmela Grindler, que participou de forma virtual do CB.Fórum. “O teste é fundamental porque, na grande maioria, são doenças genéticas, congênitas, doenças complexas, que não têm um tratamento curativo. Porém, há um conjunto de ações, inclusive de intervenções medicamentosas, que podem dar a essas pessoas uma inclusão total”, complementa a médica.

A AME, por exemplo, causa a degeneração de células nervosas do cérebro e da medula espinhal do paciente, pouco tempo após o nascimento, causando dificuldades motoras, atrofia muscular e até dificuldade na respiração. Não é possível curar a doença, ou reverter os danos já causados, mas os tratamentos disponíveis atualmente conseguem parar a sua progressão.

“Na maior parte das crianças (…), as manifestações começam até o segundo ou quarto mês de vida”, observou Zanotelli. “(A criança) tem dificuldade de sustentar a cabeça, começa a respirar com uma frequência maior. E é uma doença que evolui muito rápido. A gente não pode esperar nem uma semana”, completou o neurologista.

Prevenção para 51 doenças

Para o neurologista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Edmar Zanotelli, a ampliação do teste do pezinho para englobar 51 doenças — incluindo raras como a atrofia muscular espinhal (AME) — constitui um desafio significativo para políticas públicas de saúde.

O especialista reconhece avanços na ampliação do teste do pezinho, em especial nos grandes centros, mas afirma que o procedimento ainda tem alcance limitado, considerando as dimensões e realidades do país.

“Atualmente nós temos seis doenças contempladas pelo teste do pezinho. Alguns municípios já adotaram o teste ampliado, com mais de 50 doenças, mas isso ainda não é uma realidade nacional”, explicou Zanotelli.

De acordo com o neurologista, um diagnóstico precoce tem importância vital, para os filhos e os pais. O teste pode frear o avanço de doenças fatais e dar maior longevidade e melhor qualidade de vida para as crianças e os familiares.

“Uma doença como essa, além de afetar muito aquela criança, afeta toda uma estrutura familiar. Afeta o sistema também do SUS (Sistema Único de Saúde). Quando você faz o diagnóstico precoce e a triagem neonatal, alivia tudo isso”, ressaltou.

Agravamento

Zanotelli é especialista em doenças neuromusculares, como a AME. Cerca de um em cada 10 mil nascidos tem a doença. Segundo ele, os sintomas começam a se manifestar nos primeiros meses de vida — e podem se agravar rapidamente. “Sem tratamento, a evolução não é boa. Muitas dessas crianças acabam falecendo, ou dependendo de respiração por aparelhos”, descreveu o médico.

O teste do pezinho é realizado, idealmente, quando o recém-nascido ainda está na maternidade. A avaliação permite que a AME seja tratada antes que os sintomas apareçam. Ainda não há cura, mas o tratamento precoce pode dar uma vida bastante satisfatória aos pacientes.

“Há necessidade de implementação de um programa de triagem neonatal. É um programa complexo. Hoje, nós temos facilidade de fazer testes genéticos. Temos controle da metodologia. A gente tem conhecimento, a tecnologia está bem conhecida. Mas o mais importante é que temos um tratamento no SUS para essa condição (a AME) e é extremamente eficaz”, pontuou o médico.

Fonte: Correio Braziliense

 
Área de comentários

Deixe a sua opinião sobre o post

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Comentário:

Nome:
E-mail:
Site: