Insetos do Brasil, uma obra mais que necessária
20 de março de 2024

Obra é referência na Entomolgia brasileira. Novo livro sobre o tema, que tem edição com versão digital gratuita, acaba de ser lançado.

Conforme por muitas vezes já comentei neste nosso espaço, os insetos são fundamentais para o equilíbrio ambiental e a sobrevivência das demais espécies, incluindo a humana. No Brasil, temos uma das maiores riquezas de insetos do mundo, com cerca de 91 mil espécies conhecidas, representando 73% do total de animais registrados no nosso país [1].

Diante dessa magnitude, parece óbvia a necessidade de se empreender esforços no sentido de melhor compreender esse imenso contingente. É fato que muitas espécies de insetos ainda são desconhecidas pela Ciência e, o que é assombroso, podem desaparecer sem sequer terem sido catalogadas pelos pesquisadores. Assim, é crucial formar especialistas para conhecer a riqueza que essa fauna representa e entender como as espécies habitam e interagem na natureza. Para se alcançar tal objetivo, inegavelmente os livros são fundamentais.

A primeira obra a ostentar o título de Insetos do Brasil não é um livro propriamente dito, mas uma coleção composta por 12 volumes publicados entre 1938 e 1962, totalizando 4.226 páginas das mais valiosas informações sobre a Entomologia brasileira. Esses volumes, que abordam quase todas as ordens de insetos, são o produto do trabalho notável do médico Ângelo Moreira da Costa Lima (1887-1964). Pioneira, ela representa um verdadeiro marco na pesquisa entomológica, documentando parte significativa da riqueza e da diversidade dos insetos no país.

 

Costa Lima compilou informações detalhadas sobre morfologia, biologia, classificação, hábitos e hábitats dos nossos insetos, o que foi essencial para a formação de gerações de entomólogos e entusiastas do estudo dos insetos brasileiros. Além de estabelecer as bases para o estudo sistemático e taxonômico desses animais no país, a obra também destacou a necessidade de conservar e entender a diversidade desses organismos vitais para o equilíbrio ambiental.

A obra de Costa Lima é tão impactante que acabou propiciando uma simbiose perfeita entre criador e criatura. A ponto de ser comum se usar expressões como “vou pesquisar no Costa Lima”, “hoje eu vou ler o Costa Lima de besouros”, “procura aí no Costa Lima de lepidópteros” e por aí vai. Discentes de Biologia que estudam Zoologia no “Barnes” [2] e no “Brusca” [3], Ecologia no “Odum” [4], Bioquímica no “Lehninger” [5], ou mesmo qualquer um que tenha procurado o significado de alguma palavra no “Aurélio” [6], hão de entender.

FAUNA NEWS livro Insetos do Brasil
Os besouros (ordem Coleoptera), o mais numeroso grupo dentre todos os insetos, estão muito bem representados aqui no Brasil – Foto: Elidiomar Ribeiro da Silva

Em um grande trabalho de utilidade pública, a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) disponibilizou para download os volumes do Costa Lima. O volume 1 aborda ordens menos especiosas, como as das efêmeras (Ephemeroptera), libélulas (Odonata) e gafanhotos (Orthoptera) [7]; o 2 versa sobre os percevejos (Hemiptera) [8]; o 3 as cigarras e cigarrinhas (Hemiptera) [9]; o 4 as formigas-leão (Neuroptera), os diabos-do-rio (Megaloptera), os joões-pedreiros (Trichoptera) e as pulgas (Siphonaptera) [10]; o 5 e o 6 as mariposas e borboletas (Lepidoptera) [11] [12]; os de 7 a 10 os besouros (Coleoptera) [13] [14] [15] [16]; o 11 e o 12 as formigas, vespas e abelhas (Hymenoptera) [17] [18]. Como curiosidade, dos grandes grupos de insetos, apenas a ordem dos dípteros (Diptera), que inclui as moscas e mosquitos, não foi contemplada nos volumes do Costa Lima, por absoluta falta de tempo de vida – para tristeza geral dos dipterólogos.

Seguindo os passos de Costa Lima

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Capa da segunda edição do livro Insetos do Brasil: diversidade e taxonomia

Passado meio século desde a publicação do último volume do Costa Lima, um livro publicado em 2012 deu continuidade ao legado literário sobre a diversidade e taxonomia dos insetos brasileiros. Essa obra, cujo título é Insetos do Brasil: diversidade e taxonomia [19], foi premiada pela Sociedade Brasileira de Zoologia com o prêmio “Alexandre Rodrigues Ferreira”, destinado ao melhor livro publicado na área de Zoologia [20], além de ter sido classificada entre os dez finalistas de 2013 para o prêmio Jabuti, na modalidade “Ciências Naturais” [1]. O livro foi organizado pelos professores José Albertino Rafael (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – Inpa), Gabriel Augusto Rodrigues Melo (Universidade Federal do Paraná – UFPR), Claudio José Barros de Carvalho (UFPR), Sônia Aparecida Casari (Universidade de São Paulo – USP) e Reginaldo Constantino (Universidade de Brasília – UnB).

Contando com a participação de 71 autores, que escreveram 43 capítulos em 810 páginas, abarcando todas as ordens de insetos, o livro contribuiu para a solução do antigo problema das traduções para o português de obras gerais de Entomologia, que podem até ser boas para outros continentes, mas cuja entomofauna é suficientemente diferente em relação aos insetos daqui, resultando em dificuldades e erros para o leitor brasileiro.

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Felizmente, há importantes obras bibliográficas que exaltam os insetos brasileiros, alguns tão bonitos quanto esta ninfa de gafanhoto – Foto: Elidiomar Ribeiro da Silva

Inegavelmente, a obra elevou o patamar de qualidade da Entomologia no Brasil, passando a ser texto obrigatório de consulta e formação em laboratórios de pesquisa e aplicação, cursos de graduação e pós-graduação [21].Com tiragem de 10 mil exemplares, o livro teve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) [22].

Segunda versão saiu agora, em 2024

Mas o dinamismo da produção de conhecimento no campo do estudo dos insetos impôs mais um desafio aos organizadores que, agora em 2024, nos entregaram uma segunda edição! Contando com a participação de nada menos que 97 autores especialistas de diversas instituições do Brasil e do exterior, a nova edição do Insetos do Brasil: Diversidade e Taxonomia [1] já nasce como obra de referência obrigatória. Publicada pela Editora Inpa, a edição está revisada e ampliada, reunindo informações ainda mais abrangentes sobre morfologia, biologia, classificações, relações filogenéticas, importância agrícola, médica, veterinária, além de métodos de coletas e chaves de identificação. O livro, que, em 880 páginas, abrange 28 ordens e 679 famílias de insetos com registros para o Brasil, foi lançado no 35º Congresso Brasileiro de Zoologia, realizado de 26 a 28 de fevereiro, em Porto de Galinhas (PE).

FAUNA NEWS livro Insetos do Brasil
Uma efêmera (ordem Ephemetoptera), representante de um grupo de insetos pouco conhecido do público em geral, mas que desempenha papéis importantíssimos em grande parte dos ambientes de água doce – Foto: Frederico Falcão Salles/@frederico_salles

Uma ótima notícia é que a versão digital dessa mais recente edição está disponível para download gratuito. Felizes com os resultados da primeira edição, os organizadores resolveram publicar a segunda adicionalmente em formato eletrônico, sob licença Creative Commons, para que sua distribuição seja ampla e sem custos aos interessados [1] [23].

Tanto para a edição de 2012 quanto na atual, tive a imensa honra de contribuir com a feitura do capítulo sobre a ordem Ephemeroptera, em parceria com o amigo professor Frederico Falcão Salles, da Universidade Federal de Viçosa, que já foi entrevistado por aqui [24] e, corriqueiramente, contribui com magníficas fotografias para esta coluna. Nosso texto [25] fornece informações sobre a morfologia, estágios de desenvolvimento, biologia, relações filogenéticas e importância dos efemerópteros, insetos conhecidos popularmente como efêmeras, efeméridas, siriruias ou sararás [26].

Agradecendo aos organizadores e à Editora Inpa, não deixe de aproveitar a disponibilização gratuita [1], conferir esse livro impressionante e, principalmente, ajudar na divulgação. Os insetos brasileiros merecem.

Referências

 

Fauna News

Sobre o autor / Elidiomar Ribeiro da Silva

Licenciado em Ciências Biológicas, mestre e doutor em Zoologia pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor do Departamento de Zoologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), sendo responsável pelo Laboratório de Entomologia Urbana e Cultural. Entomólogo, tem carreira centrada no estudo da taxonomia das ordens Ephemeroptera, Hemiptera […]

Fonte: Fauna News

Elidiomar Ribeiro da Silva

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